Chico Xavier NÃO resolveu casos criminais, mas interveio quando eles eram resolvíveis


Oficialmente, o "médium" Francisco Cândido Xavier, popularmente conhecido como Chico Xavier, é creditado por ter resolvido alguns casos policiais por suposta psicografia. No entanto, a lógica dos fatos, se percebermos bem com muita atenção, mostra que ele não resolveu coisa alguma, porque os crimes ou já estavam potencialmente resolvidos, ou eram resolvíveis pelas circunstâncias em si.

Uma análise do blog Intruso Espírita contesta essa atribuição de "Detetive do Além" - só para usar um título que, por risonha ironia, deu David Nasser na famosa matéria de O Cruzeiro, em 1944 - dada a Chico Xavier, porque ele em nada resolveu nos mistérios em questão, porque eles sempre apresentaram um detalhe ou um contexto sob o qual poderiam ser resolvidos por si mesmos com facilidade. O texto de Intruso Espírita aponta alguns casos policiais envolvidos:

"1) O Henrique Emmanuel Gregoris, que causava preocupação à sua mãe, dona Augustinha, por estar portando um revólver. Ele brincava de roleta russa com os amigos, no dia 10 de fevereiro de 1976, até que João Batista França disparou um tiro acidental que matou o amigo. A investigação policial já dava como homicídio culposo (sem intenção de matar) o crime ocorrido na ocasião.

Mas Chico Xavier, um dia após à sentença pelo juiz Orimar Pontes, que absolveu João França, visitou dona Augustinha e, com uma suposta mensagem mediúnica, a leu para a senhora: "Avise minha mãe para suspender o processo contra João França. Ele é inocente e essa história toda tem prejudicado o meu crescimento espiritual".

Note-se que o caso estava praticamente resolvido e Chico Xavier apenas pegou carona na situação. Foi chover no molhado divulgar essa mensagem, que nada acrescentou ao processo e só reiterou o que já havia sido concluído pelas investigações.

2) Outra história envolveu Maurício Garcez Henrique, que estava em sua casa com o amigo José Divino Nunes que, de brincadeira, pegou o revólver do pai do outro. Ele estava na cozinha, naquele dia 08 de maio de 1978, quando José, ao tentar sintonizar uma emissora de rádio, disparou um tiro acidental nas costas de Maurício que, ao ser levado para o hospital, morreu antes de receber atendimento. José, chorando, disse que nunca desejou matar o amigo e que o disparo foi acidental.

Dona Augustinha, a mãe do rapaz morto em outro caso, entra em contato com os pais de Maurício, Dejanira e José Henrique, que, em estado de choque, foram chamados para ir a um "centro espírita". O caso foi levado, também, ao juiz Orimar Pontes, e as investigações também concluíram pelo tiro acidental, sendo crime de homicídio culposo.

Mais uma vez Chico Xavier pegou carona "tentando resolver" o que já estava resolvido pela Justiça. Divulgando uma suposta carta de Maurício, Chico mais uma vez fez chover no molhado, porque era óbvio que Maurício teria perdoado o amigo. A "psicografia" em nada acrescentou à óbvia situação, sendo uma grande ação oportunista para promover o "médium".

3) A ex-miss Campo Grande, Gleide Maria Dutra, foi morta em 01 de março de 1980 por um disparo acidental do marido João Francisco Marcondes Fernandes, conhecido por "João de Deus". Ele estava ajeitando a calça e tirando o revólver da cintura, quando sem querer atirou contra a esposa, matando-a em seguida.

As investigações, mais complexas, porque poderia se tratar de um caso de feminicídio - crime que então era conhecido como "crime passional" - , apontavam para a hipótese provável a de homicídio culposo, e consta-se que, antes de morrer, Gleide, no hospital, havia dito que o marido era inocente.

Todavia, Chico Xavier pegou carona e, mais uma vez, atraiu para si os familiares das vítimas. Tomado de profunda fascinação obsessiva, João Francisco "sentia" odores de rosas nas reuniões com Chico Xavier, ignorando que funcionários discretamente espalhavam esse perfume pelo ambiente. A "carta mediúnica" sinalizou pela absolvição do acusado, algo que já era sinalizado em investigação criminal".

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A intervenção de Chico Xavier foi motivada por puro sensacionalismo, porque os relatos dos crimes não necessitariam de supostas psicografias para serem resolvidos e, em parte, as investigações já apontavam prévias hipóteses que encaixariam nos desfechos apontados.

Alguns desses casos já estavam resolvidos e o que Chico Xavier fez foi praticamente pegar carona nos casos e, com base em hipóteses já consideradas plausíveis, forjar supostas psicografias, sempre com o estilo pessoal do "médium" escrever mensagens, para "chover no molhado".

A única coisa que surtiu efeito com isso é o crescimento da mídia policialesca, que exerceu boas sintonias com Chico Xavier nas suas afinidades com o sensacionalismo, com a espetacularização da morte e com o moralismo religioso ultraconservador, que os programas de "mundo cão" não deixam de expressar, apesar (ou, talvez, em função) do caráter grotesco dessa mídia.