Nenhum intelectual legitimou suposta psicografia de Chico Xavier

MONTEIRO LOBATO, AUTOR DE SÍTIO DO PICA-PAU AMARELO.
Não há razão para legitimar a suposta psicografia de Francisco Cândido Xavier, porque há em suas obras irregularidades imensas, com fartos indícios de provas, que simplesmente derrubam qualquer chance de autenticidade das mesmas. Os brasileiros, enfeitiçados pelas paixões religiosas e hipnotizados pela fascinação obsessiva por Chico Xavier, é que "autenticam" as obras pela Fé e nunca pela Razão, o que é um gravíssimo erro.
Note-se que, quando as "psicografias literárias" de Chico Xavier foram lançadas, sobretudo o estranho livro poético Parnaso de Além-Túmulo e a "série Humberto de Campos", houve uma grande reação dos meios literários. O que surpreende é que NINGUÉM deu como legítima a obra de Chico Xavier, e, quando muito, apenas uma parcela de escritores e intelectuais se absteve.
Oficialmente, os que se abstiveram foram erroneamente tidos como "legitimadores". Suas opiniões eram apenas especulatórias, mas ninguém declarou que a obra de Chico Xavier era legítima. Além disso, elas se basearam na falácia de que Chico Xavier fazia tudo sozinho, o que permitia a "Federação Espírita Brasileira" armar uma cilada retórica.
Com base na hipótese de "trabalho solitário", no que se refere à ação terrena, Chico Xavier era alvo de duas teses: se ele era um imitador, ele seria um "sofisticado" pastichador ou plagiador de diversos gêneros literários e dos estilos individuais dos mais diversos escritores. E se ele era mesmo médium, teria recebido a dádiva de se tornar, mesmo com modesta escolaridade, porta-voz das mais conceituadas personalidades literárias do Brasil e de Portugal.
Só que isso não procede. Chico Xavier não fazia o trabalho sozinho e seus colaboradores não eram os espíritos ilustres do além-túmulo, mas gente da Terra, como dirigentes, editores e redatores da FEB, além de consultores literários que estiveram a seu serviço. Isso é um fato comprovado até mesmo por carta que, acidentalmente, divulgou Chico agradecendo dirigentes da federação pelas revisões feitas aos manuscritos para a sexta edição (?!) de Parnaso de Além-Túmulo.
O próprio jornalista católico Alceu de Amoroso Lima, conhecido também pelo pseudônimo Tristão de Athayde, afirmou certa vez que Parnaso era uma farsa montada por editores da FEB. E o mais grave é que os críticos literários que apontavam fraude nas "psicografias" tinham razão, por uma simples questão de lógica.
Afinal, entre quem lê muito e consegue discernir gêneros literários e estilos pessoais dos escritores, e outros que mal conseguem ler um livro às pressas e, tomados pela fé religiosa, não conseguem discernir estilos nem gêneros, bastando apenas acolher a "mensagem cristã", quem é que teria mais razão? Não seriam os deslumbrados da fé que seriam os portadores dessa razão que não conseguem ter, tomados pela cegueira emocional dos "olhos do coração".
Aqui vamos mostrar os escritores que se abstiveram de julgar a "psicografia" de Chico Xavier, o que não significa que eles a legitimaram. Existe uma grande diferença entre não dizer "não" e dizer "sim", porque o fato de alguém não negar uma coisa não quer dizer que ele esteja afirmando a mesma.
Observando bem o que os escritores dizem, as declarações são sempre especulativas, na base do "se" e sem qualquer afirmação de que as obras "mediúnicas" seriam "autênticas". São apenas suposições, mas mesmo assim sem qualquer possibilidade de legitimação, apenas expressando a recusa dos escritores em adotar uma posição determinada sobre um assunto que, no fundo, desconhecem ou eram iniciantes.
Em tempo: Apparicio Torelly, o Barão de Itararé, talvez por desatenção tenha escrito errado o título de um dos livros de Humberto de Campos, Carvalhos e Roseiras, creditado como "Roseiras e Carvalhos". Vamos às opiniões:
"Se é mistificação, parece-me muito bem conduzida. Tendo lido as paródias de Albert Sorel, Paul Reboux e Charles Muller, julgo ser difícil (isso digo com a maior lealdade) levar tão longe a técnica do pastiche. Não sei como elucidar o caso. Fenômeno nervoso? Intervenção extra-humana? Faltam-me estudos especializados para concluir." - AGRIPINO GRIECO, crítico literário.
"Se Chico Xavier é um embusteiro, é um embusteiro de talento. Sua facilidade de imitar seria um dom especialíssimo, porque ele não imita apenas Antero de Quental, Olavo Bilac e Humberto de Campos, mas Alphonsus de Guimaraes, Artur Azevedo, Antônio Nobre, etc." - RAIMUNDO DE MAGALHÃES JÚNIOR, escritor e acadêmico.
"Se Chico Xavier produziu tudo aquilo por conta própria, então ele merece ocupar quantas cadeiras quiser na Academia Brasileira de Letras." - MONTEIRO LOBATO, escritor.
"Dentro em breve a Justiça terá que se manifestar a respeito da autenticidade ou falsidade das obras atribuídas ao Espírito de Humberto de Campos. O pronunciamento dos nossos tribunais sobre o assunto está sendo provocado pela família do saudoso escritor, que, com isso, deseja fazer cessar essas publicações ou participar de possíveis proventos materiais decorrentes da venda dos livros que circulam como sendo da autoria do estilista de 'Roseiras e Carvalhos' (sic).
A questão, como se vê, gira em torno da identificação de um Espírito. Mas este é justamente o grande problema, que tem sido objeto de acurados estudos, não apenas de indivíduos isolados, mas também de associações científicas da mais alta reputação em todo o mundo.
A Sociedade de Pesquisas Psíquicas de Londres, por exemplo, já tem realizado famosas experiências, sob a direção de notáveis sábios, que se valeram do controle dos mais aperfeiçoados instrumentos de Física. Esses homens, com a colaboração de um médium, conseguiram não somente a materialização de um Espírito, mas, ainda, a descrição de todo o mecanismo dessa materialização. Muitas documentações foram colhidas desses trabalhos.
Verificaram que, durante o fenômeno de materialização, o médium perdia uma parte do seu peso, porque cedia uma boa porção de seus fluidos, que eram utilizados pelo Espírito para se tornar fisicamente visível, podendo, portanto, ser também fotografado.
Para a grande maioria da Humanidade, que é como São Tomé, essas demonstrações seriam mais do que suficientes para uma crença inabalável. Mas os homens de ciência são piores do que São Tomé. Este queria ver, para crer, mas os cientistas nem vendo acreditam.
A materialização não basta para uma prova de identidade. A fotografia não é suficiente para se afirmar que se trata deste ou daquele Espírito. Nem as declarações categóricas do Espírito podem constituir por si a expressão da verdade.
Nós vimos no cinema a vida de Pasteur. Acompanhamos, cheios de emoção, os episódios culminantes das suas grandes lutas pelo bem da Humanidade. Naquele filme estava o espírito que animou a existência do apóstolo do bem. Mas aquela figura que nós víamos não era, afinal, a de Pasteur, mas a de Paul Muni.
Mas Paul Muni teve a intenção de nos mistificar?
Ou Paul Muni realizou uma obra sincera, encarnando, como um médium cinematográfico, o Espírito de Pasteur?
Diante destas perguntas, é-nos lícito indagar se a Justiça poderá se manifestar de maneira definitiva sobre a identidade do Espírito de Humberto de Campos.
Se tal fizer, provocará a maior revolução espiritual de todos os tempos, porque é atrás da solução dessa questão que de há muito se batem as vanguardas que murcham à frente da evolução". - APPARICIO TORELLY, o Barão de Itararé, jornalista e humorista.