Duas maiores provas de que Chico Xavier contrariou ensinamentos de Allan Kardec
Quando se fala que Francisco Cândido Xavier é o maior inimigo interno do Espiritismo, não se está cometendo calúnia, intolerância religiosa, manifestação de rancor ou raiva profunda de qualquer espécie. Se está, com base em análises rigorosamente de acordo com a Lógica e a Razão, apresentando conclusões que soam desagradáveis a muitos, que reagem com choro ou irritação, mas que são constatações bastante realistas e consistentes.
Muito do que Chico Xavier produziu foi ao arrepio dos ensinamentos espíritas. Sua base doutrinária é a de Jean-Baptiste Roustaing, cujas ideias igrejeiras, acolhidas em primeira hora pela "Federação Espírita Brasileira", eram mais agradáveis a seus membros e ao "médium" em particular.
Embora Chico Xavier tivesse medo em assumir a influência de Roustaing, do qual dizia "não apreciar", as ideias confirmam que ele não apenas era fortemente influenciado pelo advogado de Bordéus, mas adaptou as ideias de Os Quatro Evangelhos para o contexto brasileiro, retirando apenas pontos bastante controversos, como os "criptógamos carnudos" (humanos reencarnando em animais, plantas ou micróbios) e o "Jesus fluídico" (tese de que Jesus não estava encarnado, era só fantasma).
Chico Xavier contrariou os ensinamentos espíritas originais várias vezes. Traiu muito mais do que Judas traindo Jesus, expressou falsos testemunhos - através de obras "psicográficas" de valor e veracidade duvidosos - muito mais do que o discípulo Pedro fez sobre Jesus. Chico traiu Kardec inúmeras vezes, não por acidente ou pelo entusiasmo das origens católicas, mas de maneira inescrupulosa, proposital e com evidente consciência das causas e dos efeitos.
São muitos desvios doutrinários, que só o caráter desinformado e emocionalmente vulnerável dos brasileiros, deixa passar. Os brasileiros que cultuam Chico Xavier se rendem fácil às tentações das paixões religiosas e, para permanecer nesse verdadeiro entorpecimento emocional, apelam sempre para as restrições ao Raciocínio Lógico, usando todo tipo de falácia para alegar que "a Razão não pode tudo" (como se nosso raciocínio tivesse limites na liberdade do pensamento).
Isso também vai contra Kardec. Se, para blindar Chico Xavier, se impõe limites à Razão, apelando para o discurso dos "olhos do coração" (eufemismo para "fé cega"), isso afronta o mais precioso dos ensinamentos espíritas, que é aquele que aponta o caminho totalmente livre para o raciocínio, para verificar as coisas sob o rigoroso critério da Razão, prática abertamente estimulada pelo pedagogo de Lyon, mas vista com muita restrição pelos "espíritas" brasileiros.
Mas dois aspectos graves mostram o quanto Chico Xavier é um anti-espírita, no que se refere à doutrina matriz. São dois gravíssimos desvios que, repetimos, não foram cometidos por acidente e nem foram feitos visando o entusiasmo das origens católicas do "médium", mas feitos de propósito e com o mesmo apetite deturpador que marcou Roustaing.
Um deles se refere ao uso de "grandes nomes" para promover mistificação. Embora soe agradável para os brasileiros, por sugerir uma "patriotada" se impondo ao resto do planeta, o projeto "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho" - por ironia, popularizado por Jair Bolsonaro através de sua forma mais simplificada, "Brasil, Acima de Tudo, Deus, Acima de Todos" - é exemplo de mistificação, das mais perigosas.
NOMES ILUSTRES PARA IMPOR MISTIFICAÇÃO
Afinal, a ideia de um país liderando o mundo no âmbito político-religioso é agradável quando se trata do "nosso país", mas é uma ideia bastante perigosa. A ideia seria rejeitada severamente por Kardec, que não aceitaria a ideia da supremacia de um país, que é uma construção material, terrena, delimitada por extensões de terra válidas apenas sob o âmbito da matéria.
Não se pode atribuir predestinação espiritual a um território e experiências de países comandando o mundo só resultaram em experiências trágicas e infelizes, onde genocídios eram permitidos para eliminar do caminho aqueles que não aceitavam a supremacia político-religiosa imposta. Desconfiemos das promessas fraternais: no Catolicismo medieval do Império Bizantino, o imperador Constantino também fez as mesmas promessas de "fraternidade, paz e tolerância cristãs".
O uso de nomes ilustres para promover mistificação é um alerta que Kardec e mensageiros como São Luís e Erasto de Paneas manifestaram em várias passagens da literatura espírita original. O Livro dos Médiuns é um exemplo desse alerta, menosprezado diante da aceitação do embuste literário Parnaso de Além-Túmulo, que, estranhamente, sofreu sucessivas revisões editoriais, o que aumenta o grau de desconfiança, já bastante elevado pelo apelo sensacionalista dessa obra.
O Capítulo 10, Da Natureza das Comunicações, é contundente no aviso que os brasileiros simplesmente desprezaram, deslumbrados com o prestígio pessoal de Chico Xavier e com o caráter exótico dos nomes que o "médium" usava para promover mistificação, incluindo grandes figuras literárias:
"(...) É por isso que os Espíritos verdadeiramente superiores nos recomendam sem cessar que submetamos todas as comunicações ao controle da razão e da lógica mais severa.
É, pois, necessário distinguir as comunicações verdadeiramente sérias das comunicações falsamente sérias, o que nem sempre é fácil, porque é graças à própria gravidade da linguagem que certos Espíritos presunçosos ou pseudo-sábios tentam impor as idéias quais falsas e os sistemas mais absurdos. E para se fazerem mais aceitos e se darem maior importância, eles não têm escrúpulo de se adomar com os nomes mais respeitáveis e mesmo os mais venerados. Este é um dos maiores escolhos da ciência prática".
No Capítulo 24, Identidade dos Espíritos, há uma outra passagem, trazida pelo espírito São Luís, no item 266, sub-item 14º:
"14º) Devemos igualmente desconfiar dos Espíritos que se apresentam com muita facilidade usando nomes bastante venerados, e só com muita reserva aceitar o que dizem. Nesses casos, sobretudo, é que um controle se torna indispensável. Porque é freqüentemente a máscara que usam para levar-nos a crer em pretensas relações íntimas com Espíritos excelsos. Dessa maneira eles lisonjeiam a vaidade do médium e se aproveitam dela para o induzirem a atos lamentáveis e ridículos".
No mesmo capítulo e no mesmo item, mas no sub-item 9º, São Luís chama a atenção a respeito da linguagem empolada dos espíritos inferiores e mistificadores, e poucos sabem que o alvo dessa análise corresponde, justamente, à obra de Chico Xavier, pretensamente culta e cheia de ideias mistificadoras, típicas de espíritos bastante levianos (como leviano foi o "médium"):
9º) Os Espíritos superiores se exprimem de maneira simples, sem prolixidade. Seu estilo é conciso, sem excluir a poesia das idéias e das expressões, claro, inteligível a todos, não exigindo esforço para a compreensão. Eles possuem a arte de dizer muito em poucas palavras, porque cada palavra tem o seu justo emprego. Os Espíritos inferiores ou pseudo-sábios escondem sob frases empolgadas o vazio das idéias. Sua linguagem é freqüentemente pretensiosa, ridícula ou ainda obscura, a pretexto de parecer profunda.
Infelizmente, o que se vê no Brasil é o contrário, principalmente na Internet, onde os considerados "isentões do Espiritismo", que se passam por defensores da "imparcialidade" e do "equilíbrio de ideias", usam de toda falácia para pregar o que eles julgam dizer "a visão mais objetiva das coisas", quando na verdade querem pregar o falso equilíbrio que coloca sob o mesmo peso a Lógica e o Contrassenso.
Contrariando Kardec, esses confeiteiros da pretensa verdade tentam a todo custo criar argumentos mirabolantes, porém falsamente racionais, para dizer que "a Razão não pode tudo" e impor restrições à capacidade do pensamento lógico. Como raposas famintas, eles partem para alegações sedutoras do tipo "não acredito que o raciocínio lógico seja capaz de examinar tudo, creio que existem coisas que escapam de nossa razão e que somos incapazes de perceber dessa forma".
São pessoas muito mais preocupadas em proteger o mito de Chico Xavier, ainda que possam admitir, nele, a figura do "médium imperfeito", "que errou e falhou muitas vezes". Com essa prática em moda, feita para dissimular a vaidade humana por uma falsa autocrítica e uma postura pretensamente "gente como a gente", põe-se a sujeira debaixo do tapete, criando a permissividade do erro, já que, com o erro banalizado, ninguém precisaria, em tese, responder pela responsabilidade dos maus atos.
E isso acaba prejudicando o Espiritismo original, doutrina nunca devidamente apreciada, porque ela, no Brasil, virou refém dos próprios deturpadores, que tentam creditar os alertas de Kardec como se não fossem contra a deturpação brasileira, e usam falácias diversas para enganar as pessoas, usando dos apelos aparentemente sublimes de religiosidade e suposta defesa das virtudes humanas.
DATAS FIXAS PARA ACONTECIMENTOS FUTUROS
É moda falar da "data-limite" das supostas profecias de Chico Xavier, como se fosse algo sublime e de máxima importância. Mas essa prática é condenada, com muita severidade, pela literatura espírita original, que a define como própria de espíritos mistificadores, zombeteiros e de baixa evolução intelectual, que se divertem forjando polêmicas desnecessárias, além de sentimentos de terror, ansiedade ou expectativa a partir de datas pré-determinadas.
Esse alerta também é dado pela literatura kardeciana em vários momentos, e entre os danos que a "profecia" provoca entre os brasileiros é que ela não é unânime entre os seguidores de Chico Xavier, o que derruba o mito de que o "médium" seria um "unificador de pessoas". Na verdade, através de sua mediunidade irregular, Chico Xavier mais dividia e desunia do que unificava, causando muito sensacionalismo e deslumbramento, em prática reprovada austeramente pelo Espiritismo original.
Aqueles que cultuam Chico Xavier e recusam a admitir a validade da "data-limite" acham que essa "profecia" não foi feita pelo "médium" e atribuem a ela a imaginação fértil de Geraldo Lemos Neto. Um dos partidários dessa tese é o "médium" baiano radicado em Brasília, Ariston Teles, que diz receber Chico Xavier por psicofonia (atribuição bastante duvidosa).
A negação da "profecia", no entanto, é compensada por outro absurdo: atribuir que Chico Xavier era reencarnação de Allan Kardec, um absurdo tão imenso que nenhuma hipótese, por mais relativizada que fosse, consegue sustentar tão aberrante ideia, que ainda por cima estaria também indo contra os ensinamentos espíritas originais, diante do divertimento que representa supor encarnações passadas de personalidades, garantindo entretenimento fútil de perigosíssimas consequências.
Ainda no Capítulo 24, Identidade dos Espíritos, o espírito São Luís, no item 266, sub-item 8º, dá um alerta muito sucinto, em poucas mas contundentes palavras, que derrubam o "profetismo" de Chico Xavier num só golpe:
"8º) Os Espíritos levianos são ainda reconhecidos pela facilidade com que predizem o futuro e se referem com precisão a fatos materiais que não podemos conhecer. Os Espíritos bons podem fazer-nos pressentir as coisas futuras, quando esse conhecimento for útil, mas jamais precisam as datas. Todo anúncio de acontecimento para uma época certa é indício de mistificação".
CONCLUINDO
Só esses dois aspectos derrubam qualquer credibilidade que se atribui a Chico Xavier como divulgador do Espiritismo. Não basta dizer que ele "errou muito" ou "agiu com imperfeição", porque tais atribuições nunca resolveram os problemas que a idolatria cega ao "médium" causava da parte de seus seguidores e simpatizantes, mesmo aqueles não-sectários (que se dizem "não-espíritas").
Diante do exame rigoroso da Lógica e do Bom Senso, Chico Xavier seria reprovado sem chance de recuperação. Mas como os brasileiros são seduzidos pelas paixões religiosas, e sentem fascinação obsessiva pelo "médium" - envolto pelos apelos traiçoeiros do chamado "bombardeio de amor" - , as pessoas preferem estabelecer limites à Lógica e à Razão em vez de seguir o conselho kardeciano de submeter ao rigor das mesmas. É porque no Brasil o que prevalece é o medo da Verdade.