Não existe almoço grátis: Chico Xavier é blindado porque seus livros rendem muito dinheiro

Não existe almoço grátis, diz o ditado popular. Embora o discurso religioso fale em renúncias materiais e em desenvolvimento de tarefas sem exigir coisa alguma em troca, há muitas e muitas estranhezas, em certos casos. Outro ditado popular, que diz que, quando a esmola é demais, o santo desconfia, pode explicar muita coisa.
Muitos dormem tranquilos quando ouvem ou leem o dado oficial de que Francisco Cândido Xavier doou os lucros de seus livros "para a caridade". Tudo se repete como mantra: Chico Xavier "doou os direitos autorais para a caridade", uma alegação que é feita em palavras vagas, sem provas consistentes, num discurso meramente emocional e de veracidade bastante duvidosa.
Chico Xavier era um grande vendedor de livros. Seu apelo sensacionalista e a estratégia que ele e uma numerosa equipe de editores e redatores da "Federação Espírita Brasileira" faziam para lançar livros dos mais diversos tipos literários - das mensagens infantis, atribuídas supostamente a Meimei, às reportagens, pretensamente creditadas a Humberto de Campos, passando por livros "científicos" e romances "espíritas" - foram uma verdadeira máquina de gerar dinheiro.
Isso é bom demais para ser verdade. 400 e tantos livros? E todos de um conteúdo mistificador e dotado de moralismo retrógrado? E todo o faturamento para os mais necessitados, isso num Brasil que nunca superou sua miséria de verdade? E é tanto entusiasmo além da conta, que a gente pergunta se isso é realmente verdade que o dinheiro todo vai para os pobres e doentes. Embora quase todo mundo diga que sim, num aparente consenso, é bom desconfiar.
Primeiro, porque esses livros, na verdade, foram doados para os cofres da "Federação Espírita Brasileira", enriquecendo seus dirigentes, assim como as doações obtidas por Madre Teresa de Calcutá, supostamente recebidas "pela caridade", eram transferidas para os depósitos pessoais dos sacerdotes mais poderosos do Vaticano.
Recusar cachê não é necessariamente caridade. Tendo em mãos algumas vantagens sociais, alguém que ajude no sustento e outros benefícios, ou mesmo quando o salário é suficientemente grande que permite renunciar a certas remunerações, qualquer pessoa sem um pingo de senso caridoso pode "doar cachês", praticamente "pagando com dinheiro" o prestígio obtido com suposta filantropia.
Devemos lembrar que o mérito da renúncia do cachê deve ser visto com cautela. Existem boas ações através dessa atitude, mas observamos que há outras ações que são levianas, e observando bem o caso de Chico Xavier, que revoltava a comunidade literária por conta de obras fake, a renúncia visava a promoção pessoal e para forjar um falso voto de pobreza, pois o "médium" apenas não tocava em dinheiro, era sustentado por terceiros e levava vida confortável.
DISFARÇAR CHARLATANISMO
Em primeiro lugar, devemos admitir que os livros de Chico Xavier são obras extremamente medíocres e supérfluas, não servindo para lições de vida nem para transmissão de sabedoria. O mundo pode viver tranquilamente sem eles e, talvez, seria até melhor dispensá-los, pois esses livros apresentam conteúdo antiquado, envolvendo recomendações moralistas ultraconservadoras, velhos conceitos igrejistas e muita mistificação.
Os "isentões espíritas" querem provas? Lendo os livros de Chico Xavier, as provas pipocam aqui e ali. Defesa do trabalho exaustivo, da aceitação das desgraças em silêncio - até para orar não se pode usar a voz e, no trabalho exaustivo, deve-se dividir a mente sobrecarregada numa tarefa com a mentalização da prece - , louvores religiosos medievais e fantasias como "cidades espirituais".
Os "isentões espíritas", que arrotam pedantismo e, levantando o tom das mensagens, buscam pela posse, se, em tese, não da verdade, mas pelo menos da palavra final, nunca cobram fundamento quando Chico Xavier menciona a "cidade espiritual" de Nosso Lar. Nunca exigem rigor metodológico, aceitando tudo como está, acreditando até em bichinhos pulando no mundo espiritual.
A superprodução de livros de Chico Xavier visa abafar as acusações de charlatanismo. Como assim? Explicamos que o charlatanismo está associado a cobrança financeira das atividades religiosas e terapêuticas, mas o "espiritismo" brasileiro arrumou meios de manter as atividades gratuitas e arrumar outros meios de arrecadação financeira.
Até aí, nada demais. O problema é que a gratuidade serve de mascaramento do charlatanismo, e mesmo publicações e produtos antes comercializados acabam sendo distribuídos de graça. Tudo para dar uma aparência de "gratuidade plena", enquanto livros, filmes e outros produtos são gerados em quantidades industriais, visando captar lucros, inclusive com o apelo sensacionalista de apresentar nomes ilustres, coisa que havia sido rejeitada com muita antecedência por Allan Kardec.
Há também seminários, em que palestrantes "espíritas" se expõem para um público de maior poder aquisitivo, uma atitude que comprova a hipocrisia desses pregadores. Tidos como "humanistas", esses palestrantes, dos quais Divaldo Franco é o expoente mais conhecido, eles nunca cobram dos ricos alguma atitude para melhorar o planeta, mas os bajulam, como forma de garantir blindagem e fortalecer um lobby que permite os "médiuns" serem blindados até quando cometem abusos.
Não há necessidade dessa superprodução de livros, até porque eles resultam em obras pseudo-científicas ruins, de conteúdo intelectualmente bastante confuso, como os próprios livros "científicos" de Chico Xavier. Há, também, romances "espíritas" que parecem folhetins ruins, meros dramalhões moralistas que soam como grandes perdas de tempo literárias.
Exemplos de tudo isso podem ser facilmente identificados consultando os livros "espíritas" nas livrarias laicas ou especializadas desta religião. São obras que representam desvios doutrinários constrangedores, e tentam ofuscar o legado de Allan Kardec - que, com seus poucos livros, oferecem guia suficiente para entender todo o Espiritismo autêntico - , apresentando conteúdo igrejeiro e antiquadamente moralista.
Os livros são verdadeiras máquinas de fazer dinheiro, num Brasil amplamente desinformado e mistificado. E a venda deles, assim como os donativos, as mensalidades dos carnês em "centros espíritas" e tantas outras formas de atrair renda e valores nessas instituições, são estranhamente comemoradas com um entusiasmo além da conta, que torna impossível evitar qualquer desconfiança.
EUFORIA DEMAIS
Ninguém, em sã consciência, faz um grande carnaval porque atraiu uma grande soma de dinheiro visando doar para os pobrezinhos, famintos e enfermos. O verdadeiro altruísta que reserva sua fortuna para os mais necessitados apenas o faz com discreta satisfação, sem no entanto se vangloriar nem fazer festas e jogar fogos de artifícios só porque os "aflitos, finalmente, terão pão, casa, remédios e amor".
Vemos nos "espíritas" uma euforia além da conta. Uma alegria maior que a festa. Como alguém irá festejar demais porque uma instituição ou personalidade "espírita" obteve um significativo lucro financeiro que será "reservado aos mais necessitados"?
Ninguém, em sã consciência, repetimos, faz festejos com isso. Se há alguma euforia além da conta, é porque, evidentemente, há algo estranho por trás. Dos lucros obtidos pela venda de livros de Chico Xavier e derivados à meta financeira alcançada pelos carnês pagos pelos frequentadores de "centros espíritas", se existe uma euforia exagerada, evidentemente não é por causa dos "pobrezinhos".
Não é da natureza humana agir assim, com tremenda euforia, porque o dinheiro arrecadado, atingindo altos valores, será "totalmente aos necessitados". O instinto humano não permite que se empolgue demais quando grandes somas de dinheiro vão para os pobres e doentes, da mesma maneira que uma pessoa comemora quando ela própria ganhou na loteria. Quando existe comemoração nesse sentido, é aconselhável desconfiar. Daí o ditado da "esmola quando é demais".
Um altruísta verdadeiro pode se sentir muito alegre, mas ele nunca iria festejar de forma ostensiva, como também não se vangloriaria com isso, apenas tendo uma satisfação discreta e um prazer momentâneo que, depois, se mantém guardado na memória, enquanto o altruísta parte para um outro trabalho. O altruísta fica feliz, mas não fica pensando demais na caridade feita.
Chico Xavier não foi assim. Sua "caridade" era festejada até demais, mediante resultados muito medíocres. Ele mesmo fez atos duvidosos sob o rótulo de filantropia, como as "cartas mediúnicas", que mais promovem sentimentos obsessivos e alimentam o sensacionalismo da mídia, e as "caravanas da caridade", que mais parecem propagandas ostensivas do "médium" às custas de atos medíocres de puro Assistencialismo.
O "bondoso médium" se tornou celebridade, obtendo fama, prestígio e poder com seus livros e vários deles, lamentavelmente, se projetaram através de muito sensacionalismo, apresentando irregularidades diversas, sobretudo quando o conteúdo "psicográfico" diverge - e há muitíssimas provas robustas a respeito - com os aspectos pessoais dos autores mortos alegados.
O conteúdo desses livros é de uma mediocridade gritante e eles só são levados a sério dentro dos limites de seus seguidores no "espiritismo". Embora, com certa arrogância, o médico goiano e escritor "espírita" Marcelo Caixeta alegue que a obra de Chico Xavier abraça uma "complexidade de áreas do Conhecimento", como Filosofia, Antropologia, Sociologia, Jornalismo e História, a repercussão e projeção desses livros nessas áreas e fora do contexto "espirita" são extremamente baixas e inexpressivas.
Nos ambientes filosóficos, antropológicos, jornalísticos etc, as obras "psicográficas" de Chico Xavier supostamente especializadas nesses âmbitos não são levadas a sério e nem sequer são aproveitadas, e isso diz muito quanto ao conteúdo medíocre e supérfluo desses livros, que demonstram um baixo nível intelectual gritante, além de profundo grau de pedantismo, que os desqualifica como fontes de saber, mesmo em padrões medianos.
A diversidade de segmentos dos livros de Chico Xavier, produzidos em escala industrial com a ajuda de editores da FEB, só teve como objetivo o lucro financeiro, aumentando o poder dos dirigentes "espíritas" e fortalecendo um lobby junto ao meio literário, midiático e jurídico.
Esse lucro não foi para os pobrezinhos, famintos, enfermos, desamparados de toda espécie. Eles só recebiam pequena parte das verbas federais para as instituições "espíritas" e outras aplicações parciais de recursos. A maioria do dinheiro obtido é para aumentar o enriquecimento financeiro e o poder dos dirigentes, palestrantes e "médiuns" do "espiritismo" brasileiro, aumentando sua fama e fortalecendo o prestígio obtido pelas paixões religiosas terrenas.
Ninguém vai defender com tanta convicção um ídolo religioso se não houver algo em troca. Alguém por acaso vai blindar alguém que joga milhões de reais para os pobres? Mesmo quando o discurso apela para essa ideia discutível, sempre há um propósito estranho de promoção pessoal.
Se tem tanta gente defendendo a "caridade" de Chico Xavier, não é pelos doentes e miseráveis. Deixemos de tanta hipocrisia, pois o que se defende é um ídolo religioso que vende muitos livros e garante o parâmetro anestesiante que predomina no mercado literário, com obras analgésicas que passam muito longe de qualquer função de promover o Conhecimento e o Esclarecimento.
Não existe almoço grátis e, quando a esmola é muita, o santo desconfia. E quantos santos católicos talvez, lá no céu, tenham se horrorizado com os festejos exagerados dos "espíritas" que tentam enganar a sociedade dizendo que a riqueza obtida é "para os desamparados".
Se isso tivesse ocorrido, o Brasil teria se tornado, faz tempo, uma das sociedades mais avançadas do planeta. Mas a miséria e a fome só aumentam, e, de parte dos "espíritas", isso não é culpa dos obsessores espirituais, mas dos próprios "espíritas" mais preocupados com o prestígio extremo às custas de tão pouca caridade.