Divaldo Franco é anti-kardeciano até no pretenso saber

O Brasil é um país vulnerável a várias armadilhas. Daí a eleição surreal de Jair Bolsonaro como presidente da República, contrariando até mesmo os mais diversos conselhos. A gente fica imaginando se os brasileiros seriam capazes de ignorar até Jesus Cristo, se ele se materializasse e gritasse para todo mundo evitar eleger o político fascista que hoje governa o nosso país.
As pessoas são tão desinformadas e ignorantes até quando tentam mostrar o contrário. Iludidos com a quantidade de informações recebidas pela mídia hegemônica e dotados de pretensão "intelectual" que a overdose informativa lhes permite ter, criando um verniz de "imparcialidade" e "rigor metodológico" que não passam de uma cosmética pedante, cobrando "rigor intelectual" dos outros sem no entanto desenvolverem o seu próprio, há os "isentos" que parecem mais defender o estabelecido do que desenvolver alguma questão.
Sob a desculpa de "enriquecer o debate", eles puxam para trás. Como alguém querendo fazer marcha-a-ré, admitindo "problemas" na causa que defendem, mas sempre neutralizando questionamentos, pouco a pouco, até deixar tais "problemas" do jeito que estão.
É por isso que os "isentões espíritas" blindam Francisco Cândido Xavier usando esse método. Criam concessões como "admitir" que Chico Xavier não foi "profeta" nem "semi-deus", que nem toda sua obra literária vale a pena, mas usam o discurso para salvar sua reputação, de maneira com que, de etapa em etapa, possam recuperar até mesmo a imagem divinizada do "médium", através de uma falácia pretensamente imparcial.
Divaldo Franco é beneficiado da mesma maneira, na essência, embora com alguns pequenos detalhes diferentes. A exemplo de Chico Xavier, Divaldo Franco também é blindado pela suposta "caridade", embora chame a atenção uma declaração lamentosa de José Herculano Pires em carta ao colega jornalista Agnelo Morato:
"Do pouco que lhe revelei acima você deve notar que nada sobrou do médium que se possa aproveitar: conduta negativa como orador, com fingimento e comercialização da palavra, abrindo perigoso precedente em nosso movimento ingênuo e desprevenido; conduta mediúnica perigosa, reduzindo a psicografia a pastiche e plágio – e reduzindo a mediunidade a campo de fraudes e interferências (caso Nancy); conduta condenável no terreno da caridade, transformando-a em disfarce para a sustentação das posições anteriores, meio de defesa para a sua carreira sombria no meio espírita".
Enquanto usa a "caridade" como escudo - a exemplo de Chico Xavier - , Divaldo Franco desenvolve um verniz diferente do seu mestre. Ele adota um tom pretensamente professoral, falsamente científico, que exibe em participações fixas ou eventuais em programas de televisão.
Analisando as obras literárias de Divaldo Franco, vemos que as mesmas não têm a sutileza de forjar diferentes linguagens como a de Chico Xavier - que tinha uma equipe de colaboradores e consultores literários para ajudá-lo a forjar suas obras - , mas um só padrão de linguagem, podendo ser o próprio Divaldo como também o suposto espírito de Joana de Angelis ou personalidades como o escritor Manuel Filomeno de Miranda, o político Marechal Deodoro e o dirigente "espírita" Adolfo Bezerra de Menezes, o "doutor Bezerra".
São mensagens de um mesmo tom. Elas não variam em texto, em pretensa erudição, em pedantismo explícito, em moralismo religioso escancarado. Tudo demonstra não ser mais do que ideias vindas da mente pessoal de Divaldo Franco, que, embora mais esperto que Chico Xavier na sua dissimulação "intelectual", é pouco habilidoso no verniz de linguagens "diferenciadas" das supostas psicografias.
Outro detalhe a observar é que, se Divaldo Franco não teve esse cuidado de diversificar sua linguagem, ele ao menos "distribuiu" seu discurso de duas formas. Embora tanto nos livros quanto nas palestras se observa tanto o pedantismo intelectual quanto os apelos igrejistas, a ênfase varia em cada forma. Nos livros, predominam os apelos igrejeiros. Nas palestras, é o pedantismo científico que se destaca.
E é aí que Divaldo Franco se mostra ainda mais antagônico a Allan Kardec. Em várias passagens, o Codificador havia reprovado a expressão de espíritos levianos - ele falava de desencarnados, mas podemos atribuir, com segurança, também aos encarnados, pois os efeitos são os mesmos - que se apresentam com a pretensão de ter respostas definidas sobre tudo.
Em O Livro dos Médiuns, Capítulo 24, Identidade dos Espíritos, Divaldo Franco pode ser desmascarado sem hesitação, a partir dos argumentos do mestre lionês, em dois subitens do item 267:
4º) A linguagem dos Espíritos superiores é sempre digna, elevada, nobre, sem qualquer mistura de trivialidade. Eles dizem tudo com simplicidade e modéstia, nunca se vangloriam, não fazem jamais exibição do seu saber nem de sua posição entre os demais. A linguagem dos Espíritos inferiores ou vulgares é sempre algum reflexo das paixões humanas. Toda expressão que revele baixeza, auto-suficiência, arrogância, fanfarronice, mordacidade é sinal característico de inferioridade. E de mistificação, se o Espírito se apresenta com um nome respeitável e venerado.
5º) Não devemos julgar os Espíritos pelo aspecto formal e a correção do seu estilo, mas sondar-lhes o íntimo, analisar suas palavras, pesá-las friamente, maduramente e sem prevenção. Toda falta de lógica, de razão e de prudência não pode deixar dúvida quanto à sua origem, qualquer que seja o nome de que o Espírito se enfeite.
7º) Os Espíritos bons só dizem o que sabem, calando-se ou confessando a sua ignorância sobre o que não sabem. Os maus falam de tudo com segurança, sem se importar coma verdade. Toda heresia científica notória, todo princípio que choque o bom senso revela a fraude, se o Espírito se apresenta como esclarecido.
8º) Os Espíritos levianos são ainda reconhecidos pela facilidade com que predizem o futuro e se referem com precisão a fatos materiais que não podemos conhecer. Os Espíritos bons podem fazer-nos pressentir as coisas futuras, quando esse conhecimento for útil, mas jamais precisam as datas. Todo anúncio de acontecimento para uma época certa é indício de mistificação.(7)
9º) Os Espíritos superiores se exprimem de maneira simples, sem prolixidade. Seu estilo é conciso, sem excluir a poesia das idéias e das expressões, claro, inteligível a todos, não exigindo esforço para a compreensão. Eles possuem a arte de dizer muito em poucas palavras, porque cada palavra tem o seu justo emprego. Os Espíritos inferiores ou pseudo-sábios escondem sob frases empolgadas o vazio das idéias. Sua linguagem é freqüentemente pretensiosa, ridícula ou ainda obscura, a pretexto de parecer profunda.
Este subitem se refere ao autoritarismo da suposta Joana de Angelis que, numa ocasião em que Divaldo Franco estava doente e muito exausto, necessitando de repouso, o suposto espírito ordenou para continuar trabalhando, numa clara defesa ao trabalho exaustivo, causa direitista também corroborada por Chico Xavier, também afeito a obedecer ordens semelhantes do mentor Emmanuel:
10º) Os Espíritos bons jamais dão ordens: não querem impor-se, apenas aconselham e se não forem ouvidos se retiram. Os maus são autoritários, dão ordens, querem ser obedecidos e não se afastam facilmente. Todo Espírito que se impõe trai a sua condição.
São exclusivistas e absolutos ns suas opiniões e pretendem possuir o privilégio da verdade. Exigem a crença cega e nunca apelam para a razão, pois sabem que a razão lhes tiraria a máscara.
A pretensão de Divaldo Franco em "responder todos os assuntos", nas suas exposições em palestras e participações na mídia, apresenta arrogância e pretensiosismo própria de espíritos levianos. A série Divaldo Responde é uma aberração à qual ninguém deveria reservar um único centavo e nem sequer obtê-la de graça.
A título de comparação, o historiador Eric Hobsbawm, já falecido, um dos maiores intelectuais do mundo, famoso por seus brilhantes livros históricos, não cansava de afirmar que "procurava explicar" determinados fatos históricos, não raro agradecendo a outros professores, a colegas historiadores ou mesmo a alunos o fornecimento de dicas, sugestões e até questionamentos.
Hobsbawm é o tipo do intelectual que lança questões e informações, mas sem a arrogância da posse do saber, que é o caso de Divaldo. Este se revela um mistificador, que usa apenas uma roupagem intelectual que só convence porque a maioria dos brasileiros é desinformada, mesmo quando se julgam "inteligentes" e revestem de verniz de "objetividade" e "imparcialidade" para defender ideias de valor lógico bastante duvidoso, como as que cercam Divaldo Franco e Chico Xavier.