Humberto de Campos não seria omisso quanto à patente literária, como supôs a "psicografia"

HUMBERTO DE CAMPOS NUMA DE SUAS ÚLTIMAS IMAGENS, EM 1934.
Na mensagem publicada em 15 de julho de 1944, atribuída ao espírito Humberto de Campos, em razão do processo judicial movido por seus herdeiros, há um aspecto muito estranho que, no caso de atribuir veracidade à suposta psicografia, teríamos que definir o autor maranhense como um panaca.
Sim, é isso mesmo que se fala: PANACA. Um idiota, um abobalhado, um omisso e um irresponsável contra si mesmo. Afinal, a declaração abaixo é de um teor bastante patético, ao qual se põe como ganhador de causa Francisco Cândido Xavier, embora este tivesse saído de um empate jurídico, quando o juiz suplente da 8ª Vara Criminal Federal do Distrito Federal (Rio de Janeiro), João Frederico Mourão Russell, julgou o caso improcedente.
Vamos à mensagem e, depois, às nossas considerações:
"Eis, porém, que comparecem meus filhos diante da justiça, reclamando uma sentença declaratória. Querem saber, por intermédio do Direito Humano, se eu sou eu mesmo, como se as leis terrestres, respeitabilíssimas embora, pudessem substituir os olhos do coração. Abre-se o mecanismo processual, e o escândalo jornalístico acende a fogueira da opinião pública. Exigem meus filhos a minha patente literária e, para isso, recorrem à petição judicial. Não precisavam, todavia, movimentar o exército dos parágrafos e atormentar o cérebro dos juízes. Que é semelhante reclamação para quem já lhes deu a vida da sua vida? Que é um nome, simples ajuntamento de sílabas, sem maior significação? Ninguém conhece, na Terra, os nomes dos elevados cooperadores de Deus, que sustentam as leis universais; entretanto são elas executadas sem esquecimento de um til".
Além da mensagem trazer, explicitamente, o estilo pessoal de Chico Xavier, ela revela uma argumentação confusa, que mistura filantropia e obra literária, sendo também um texto prolixo, de leitura cansativa, e ainda cita a expressão "olhos do coração", que, na verdade, é um eufemismo para a "fé cega" que Allan Kardec reprovava, por ser a pretensão da fé religiosa em estar acima da Razão e da Lógica.
O suposto desprezo de Humberto de Campos à sua patente literária é um dado muito, muito estranho. Além disso, cria impasses e problemas dos mais diversos e mostra que a "obra espiritual" não é daquele a que se atribui a autoria do além-túmulo.
Há aspectos muito estranhos, como dizer que o processo judicial é uma "ingratidão" - "Exigem meus filhos a minha patente literária e, para isso, recorrem à petição judicial. Não precisavam, todavia, movimentar o exército dos parágrafos e atormentar o cérebro dos juízes. Que é semelhante reclamação para quem já lhes deu a vida da sua vida?" - , revelando outra grande confusão no argumento, que é misturar processo judicial com falta de afeição ao familiar morto.
É muito estranho apelar para ideias como "Que é um nome, simples ajuntamento de sílabas, sem maior significação?". Humberto realmente pensaria assim, desprezando a sua memória social na Terra. Evidentemente NÃO. E a suposta psicografia, se Humberto tivesse realmente se manifestado, teria desmentido sua autoria espiritual, porque o estilo foge à sua natureza pessoal conhecida por sua obra na Terra.
Não faz sentido desprezar a questão da patente literária, e o texto é de uma covardia sem nome. Humberto não teria considerado seu nome como um "ajuntamento de sílabas". A ideia é 100% de Chico Xavier, que não podia assumir claramente que "foi Humberto que realmente fez" e não teria escrito na "psicografia" coisas como "Duvidam que eu, Humberto, tenha escrito obras de mensagens tão edificantes, e a dúvida à minha autoria me deixa profundamente entristecido".
A ESTRANHA POSTURA DE MANTER A QUESTÃO "EM ABERTO"
O processo judicial ainda estava em andamento e Chico Xavier não podia dizer que seu "Humberto de Campos" era verdadeiro. Daí a mensagem dotada de muita omissão e que, com argumentação bastante confusa, na qual se preferiu que um caricato "Humberto" dissesse que desprezava a patente literal, declarando, à maneira de Chico Xavier, que os "elevados colaboradores de Deus" agiam no anonimato.
A postura é, comprovadamente, covarde, como citamos. E mostra que o caso Humberto de Campos sempre foi marcado de uma omissão cafajeste. Não é preocupação do "meio espírita" buscar a autentificação da "psicografia", porque se isso for feito, ela será negada, porque há aspectos que comprovam que o estilo "espiritual" é um, o estilo original de Humberto é outro.
O próprio Alexandre Caroli Rocha havia também embarcado nessa aventura covarde de deixar sempre a questão "em aberto", sem provar se a obra "mediúnica" que leva os nomes de Humberto de Campos ou Irmão X são verdadeiras ou falsas, em artigo publicado na revista Ipotesi, de Juiz de Fora, de julho-dezembro de 2012, intitulado "Complicações de uma estranha autoria (O que se comentou sobre textos que Chico Xavier atribuiu a Humberto de Campos)":
"Vimos que não é pertinente a pressuposição de que, por meio apenas de fatores textuais, seja possível autenticar ou refutar a alegação do médium. Mostramos que os textos colocam à tona a discussão a respeito do post-mortem, tema que, nos ambientes acadêmicos, costuma ser relegado a domínios metafísicos ou religiosos. Concluímos, pois, que os veredictos taxativos para a identificação do autor são possíveis somente com a assunção de uma determinada teoria sobre o postmortem ou sobre o fenômeno mediúnico. Quando, no debate autoral, ignora-se a relação entre teoria e texto, percebemos que a apreensão deste é bastante escorregadia, mesmo entre leitores especialistas".
Isso é uma verdadeira defesa da desonestidade intelectual e mostra o quanto os "espíritas" querem fazer o que quiserem com os mortos, se aproveitando que eles não estão aí para reclamarem. E o pior é que a questão é deixada "em aberto", supostamente dependendo de um exame mais apurado, mas os livros continuam sendo publicados livremente, inclusive para download gratuito na Internet.
Além de ser uma grande ofensa à memória de Humberto de Campos, ironicamente sobrevivendo hoje não por sua obra original, mas pelas obras fake tidas como "mediúnicas", a aventura "psicográfica" de Chico Xavier, só neste caso, revela uma prática severamente reprovada por Allan Kardec, que é o uso de um nome ilustre para obras de pura mistificação religiosa, ao arrepio da Lógica e do Bom Senso.