Chico Xavier é um péssimo consolador para quem perdeu entes queridos
Para começo de conversa, devemos pensar no cotidiano das pessoas, quando elas perdem entes queridos. Devemos imaginar todo o processo de noticiar a tragédia de alguém para amigos e familiares, e o impacto inicial que isso provoca.
As pessoas levam um choque. De repente aquela pessoa de convívio íntimo morreu de alguma maneira. A tristeza não tarda a vir. As pessoas ficam pasmas, sem entender. O morto lhes parecia próximo e se tornou distante. O cotidiano com ele, que parecia um eterno presente, torna-se um passado irrecuperável.
Chega o processo de luto, conforme a pesquisadora suíça-estadunidense Elisabeth Kübler-Ross (1926-2004), se dá nas seguintes etapas: negação (choque), raiva (indignação com a perda), barganha (buscar compensação imediata), depressão (consciência da perda irreversível) e aceitação (planejar o futuro mediante essa perda).
É um processo doloroso, mas que cabe ao íntimo da privacidade, além do qual se deve exercer o luto de maneira mais breve possível. Não é um sentimento que possa ser corrompido pelo alarde, assim como deve ser explorado com muito cuidado, para evitar ofensas e o agravamento de tristezas que, não obstante, podem gerar novas tragédias.
E aí entra o "bondoso" Francisco Cândido Xavier, com suas "cartas mediúnicas" divulgadas nas suas reuniões "espíritas" em Uberaba. E muitos se iludem com Chico Xavier porque ele vem com a "novidade" da "vida futura", explorando, de maneira leviana e sem fundamentação científica a ideia da "vida após a morte".
Entendemos que existe vida após a morte por questões de natureza filosófica. Cientificamente, as confirmações sobre isso são muito iniciantes, e pouco sabemos a respeito dessa realidade. Por isso, não será a "maravilhosa obra" de Chico Xavier que trará respostas a respeito, por ela se basear apenas em apelos emocionais e nos devaneios da fé religiosa.
ESPETACULARIZAÇÃO DA MORTE
Com as "cartas mediúnicas", Chico Xavier trouxe mais problemas do que soluções. Ele obteve promoção pessoal às custas dessa suposta caridade, que se torna mais perversa do que se pode imaginar, considerando que ela expôs e prolongou sentimentos de luto, atrapalhando a privacidade das famílias que deveriam consumir seus lutos rapidamente, mas o têm prolongado pela exploração dos episódios trágicos.
Chico Xavier, com tais eventos, promovia a "espetacularização da morte", e de maneira bastante sensacionalista jogava apelos emocionais do tipo "voltamos" (quando as pessoas retornam ao mundo espiritual), dentro de sua mania de explorar contradições como "vida" e "morte", que em nada ajudam para entender realmente a vida espiritual, porque tudo se prende nas especulações emotivas e num sentimentalismo piegas.
Não bastasse o fato das "cartas mediúnicas" serem fake, produzidas pela combinação entre "leitura fria" e consultas de fontes escritas, o que é um outro assunto que não cabe nesta postagem, vemos o quanto é chato investir em "exército de palavras" para consolar os mortos. E aí vem uma grande ironia.
Chico Xavier sempre pregou que as pessoas sofredoras teriam que suportar as desgraças em silêncio. Nem as preces eram aconselhadas a serem feitas em viva voz. Talvez nem gemer de dor fosse permitido, mas apenas discretos prantos, quando muito.
Devemos lembrar que essa "consolação" não se dava apenas através de mensagens atribuídas a pessoas comuns mortas. Os livros de Chico Xavier (ainda que atribuído a espíritos de terceiros) e os depoimentos dele mesmo são verdadeiros palavreados que, do contrário que muitos acreditam, são supérfluos e sem a menor necessidade.
CHICO XAVIER "PLAGIOU" ATÉ O AMIGO DA ONÇA, QUANDO TENTAVA CONSOLAR AS PESSOAS QUE PERDERAM ENTES QUERIDOS.
Essa dispensabilidade da consolação não é difícil de ser compreendida. Muitas pessoas se revoltam quando se fala que não há necessidade das palavras de Chico Xavier para consolar as pessoas que perdem entes queridos. Mas, paremos para pensar, essas palavras não só são desnecessárias como seria melhor que elas nem tivessem sido escritas ou faladas.
Em primeiro lugar, é só as pessoas verificarem seus cotidianos. Nada mais chato do que alguém ficar falando o tempo todo palavrinhas de suposta consolação. Nada mais insuportável do que ver alguém que, diante do luto alheio, fica falando demais de que "tudo está bem", "o falecido está melhor lá em cima", "o jeito é tocar para a frente" etc. Ninguém aguentaria, não é verdade?
Pois é justamente em momentos assim que as pessoas necessitam de silêncio. Elas precisam pensar em si mesmas, sem que um chato viesse com seu palavreado para tentar consolar os outros. Em muitos casos, isso atrapalha muito e a mania de certas pessoas em se intrometerem, sob o pretexto de ajudar, acabam mais prejudicando do que beneficiando.
Além do mais, se prestarmos atenção nas mensagens "consoladoras" de Chico Xavier, elas lembram muito, pasmem, as charges do Amigo da Onça, que, ironicamente, foi uma criação do cartunista pernambucano Péricles Maranhão para a revista O Cruzeiro, e o desenhista morreu em 1961 por suicídio, abalado com as gozações que recebia em torno do famoso personagem. O suicídio, sabemos, é criminalizado pelo "movimento espírita", que o trata como se fosse "crime hediondo".
Diante da tragédia humana, imaginamos o Amigo da Onça dizendo, para familiares que perderam um ente querido e o contemplam em um velório, falando que essas famílias estão vivendo "o melhor período de suas vidas".
Era mais ou menos que Chico Xavier fazia, quando pregava aos sofredores "aguentarem a barra", visando as "bênçãos futuras". Chico Xavier chegava ao cinismo de aconselhar os sofredores a se conformarem com sua desgraça, a nunca reclamar da vida, dizendo que "enquanto você sofre, os rios seguem seu curso e os passarinhos voam como sempre voaram". Ficar dizendo para os sofredores extremos se contentarem com sua situação e verem passarinhos voando não é um cinismo típico do Amigo da Onça?
Ninguém precisa de Chico Xavier para ser consolado. O melhor é que as pessoas trabalhem suas tragédias consigo mesmas, através de seus amigos íntimos e parentes, sem que alguém "de fora" atrapalhe as emoções já dolorosas com palavreados cínicos, palavras que não têm o menor sentido, porque elas não podem traduzir sentimentos.
Daí que Chico Xavier, em atitude que muitos, ingenuamente, pensavam ser a "sua maior caridade", causou, isso sim, um sério prejuízo a muitas famílias, explorando de maneira sensacionalista a tragédia humana, transformando a morte num espetáculo, fazendo as reuniões "mediúnicas" verdadeiras orgias das paixões religiosas e prolongando o luto que poderia ser superado em poucos dias. Chico Xavier foi um péssimo consolador, aliás, um dos piores!