Ferramenta relacionada a 'fake news' e 'deep fake' foi testada em obras de Chico Xavier

CHICO XAVIER E STEVE BANNON - APREÇO AOS FAKES.
Uma tecnologia usada para analisar a obra de Francisco Cândido Xavier, a Deep Learning, é a mesma usada para a produção de algoritmos para o desenvolvimento não somente de fake news (notícias falsas), como também anaboliza as redes sociais com uma falsa multidão de supostos internautas, chamadas de "robôs", que divulgam notícias e páginas que dificilmente seriam populares por motivos naturais e se popularizam através desses mecanismos artificiais.
Segundo o sítio Superinteressante, complacente com Chico Xavier e voltada aos "isentões espíritas" - que supostamente adotam uma abordagem "imparcial" do pretenso médium - , foram analisadas obras atribuídas a "espíritos" como Emmanuel, André Luiz e Humberto de Campos.
O trabalho foi desenvolvido pela empresa Stilingue, dedicada a monitorar as redes sociais através de algoritmos. A empresa, brasileira, tem sede em São Paulo. A pesquisa, usando a técnica de inteligência artificial Deep Learning, chegou à conclusão de que as obras dos "diferentes autores espirituais" são "mesmo diferentes".
Foi desenvolvida uma estratégia na qual se misturaram os estilos de cada suposto autor espiritual. Longos livros são digitalizados e suas informações são armazenadas em três diferentes bots (bot, simplificação de web robot, é um software destinado a simular ações humanas), com um mínimo de um milhão de caracteres. Um livro de cada suposto espírito foi usado para a experiência.
"Misturaram os textos de diferentes autores. Mandaram o bot do Emmanuel escrever com base na obra do Humberto, o do Humberto imitar o André e assim por diante. Deu errado: a taxa de erro disparou. Os modelos eram incapazes de encontrar os mesmos padrões de estilo de uma entidade espírita nos livros da outra. Os autores são, sim, marcadamente diferentes", diz o texto.
A amostra exibida pela matéria de Superinteressante envolve uma passagem atribuída a André Luiz:
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André Luiz: entidade espírita vs. bot
Este primeiro texto foi psicografado por Chico Xavier
Os encarnados presentes viam tão-somente o corpo de Otávia, dominado pelo sacerdote que lhes era invisível, quase a rebentar-se de soluços atrozes, mas nós víıamos além. A nobre senhora desencarnada postou-se ao lado do filho e começou a beijá-lo, em lágrimas de reconhecimento e amor. Pranto copioso identificava-os. Cobrando forças novas, a genitora continuou:
– Perdoe-me, filho querido, se noutra época induzi o seu coração à responsabilidade eclesiástica, modificando o curso de suas tendências. Suas lutas de agora me atingem a alma angustiada. Seja forte, Marinho, e ajude-me! Desvencilhe-se dos maus companheiros! Não vale rebelar-se. Nunca fugiremos à lei do Eterno! Onde você estiver, a voz divina se fará ouvir no imo da consciência…
Nesse momento, observei que o sacerdote recordou instintivamente os amigos, tocado de profundo receio. Agora que reencontrava a mãezinha carinhosa e devotada a Deus, que sentia a vibração confortadora do ambiente de fraternidade e féé, sentia medo de regressar ao convívio dos colegas endurecidos no mal.
Já este foi criação da inteligência artificial
A primeira vez mais providencial de serviço de sua consciência, a senhora Laura encontrava-se com a presença de alguns, com a sua consciência espiritual e a medicina de amor, acrescentou:
– O controlador de serviço está disposto a escapar com as mesmas expressões de alegria.
A primeira vez mais forte de algum tempo, a senhora de Alexandre prosseguiu a companheira de serviço e considerando a alegria da conversação despediu-se:
– Neste momento, a maioria dos companheiros encarnados estão através de construções destruidoras e desencarnadas. A consciência tem sempre a construção do coração.
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Do contrário do que atesta a matéria, não observamos diferenças entre os dois textos. O fato de haver parágrafos curtos ou longos não garante a diferença de estilo, até porque Chico Xavier parece escrever o mesmo texto, a mesma narrativa, mesmo em obras "diferentes", e isso se reflete quando, nesta passagem, a linguagem parece formalmente alterada, mais na distribuição e extensão de parágrafos do que pelo conteúdo textual, que permanece o mesmo, refletindo o estilo pessoal do suposto médium.
Foram constatadas margens de erro de 22% para André Luiz, 5% para Emmanuel e 32% para o Humberto de Campos. Admitiu-se a possibilidade cética de Chico Xavier, a exemplo de Fernando Pessoa, também testado pela Deep Learning, ter feito uma criação consciente e deliberado do suposto médium em criar obras usando personalidades diferentes.
A Superinteressante erra ao dar o seguinte parecer, no final do texto:
"A psicografia segue como uma questão de fé. Mas se o estudo atesta algo, é a genialidade do médium. Escrever o volume de texto que ele escreveu, com personas comprovadamente distintas, mas uniformes entre si, não precisa nem ser sobrenatural para ser absolutamente impressionante. Ou, como colocou Monteiro Lobato, “Se Chico Xavier produziu tudo aquilo por conta própria, então ele merece ocupar quantas cadeiras quiser na Academia Brasileira de Letras".
E por que o erro de Superinteressante? Simples. Primeiro, por ofender a memória dos escritores falecidos através da "questão de fé", como se um religioso pudesse se passar por um morto e as pessoas "terem o direito" de acreditar ou não na suposta veracidade de suas obras. Ou seja, literatura fake com conteúdo cristão é permitida, ainda que sua autenticação fosse uma hipótese pendente e deixada "em aberto".
Outro equívoco de Superinteressante é citar uma frase de um distanciado Monteiro Lobato, que se absteve de avaliar as supostas psicografias, dizendo que Chico Xavier "poderia ter feito tudo aquilo por conta própria". Sabemos que, embora Chico Xavier seja responsável por pastiches e fraudes "mediúnicos", ele contou também com colaboração de uma equipe editorial da FEB.
A Deep Learning é uma das ferramentas usadas para manipular algoritmos em portais de redes sociais como o Facebook e o WhatsApp, mas também os vídeos "recomendados" do YouTube. É, portanto, uma ferramenta usada para repercutir notícias falsas, em vídeos adulterados de qualquer maneira. A Deep Learning, portanto, é produtora de algoritmos e "robôs" que influíram para as vitórias de Donald Trump nos EUA e Jair Bolsonaro no Brasil, através da atuação da empresa Cambridge Analytica, também dos EUA, nas duas campanhas presidenciais.
Ver que uma técnica como a Deep Learning ter sido usada para "tentar legitimar" a suposta psicografia de Chico Xavier pode parecer, à primeira vista, uma curiosidade. No entanto, essa técnica em nada ajuda na autenticação das obras "mediúnicas", antes se tornando um elemento para aumentar ainda mais a farsa desses livros, e da forma "diferenciada" como foram trabalhadas as identidades fake produzidas pelo "médium".