Seguidores de Chico Xavier têm nível de compreensão medíocre



Muitos brasileiros não sabem, mas estão atolados numa vida de profunda mediocridade. E não se trata porque ela é desprovida de abnegações, desapegos ou beatitudes, mas o contrário: essa mediocridade é o resultado de muitas renúncias, resignações, ambições, abnegações e outras atitudes que parecem moderadas ou equilibradas, de um lado, e desafiadoras, de outro, mas que não passam de vícios ocultos de nosso apetite vital desmedido.

No âmbito da religião, a mitificação de Francisco Cândido Xavier é ao mesmo tempo condicionada e condicionadora da mediocridade humana, realimentando esse jeito medíocre que faz o Brasil viver um "complexo de vira-lata", numa confusa obsessão de grandeza para coisas sem importância. O "complexo de vira-lata" é uma obsessão dos brasileiros em parecerem equilibrados e despretensiosos, mas os deixa imersos numa grande e preocupante confusão.

Hoje as pessoas não sabem o que realmente querem na vida. Um exemplo dessa confusão de sentimentos pode ser observado na tragédia humana. Os brasileiros são "fortes" para suportar mortes prematuras de grandes gênios da nossa cultura, mas são muito "fracos" para aguentar a notícia de um feminicida rico e impune que, em casa, morre de infarto fulminante na casa de, digamos, 50 anos de idade. Um alpinista moral a menos aflige mais do que alguém que contribui para nosso progresso cultural nos deixar tão cedo.

A própria ideia de "gente como a gente", na verdade, carregada de um preocupante preconceito social, remete a essa confusão mental dos brasileiros, que, num dado momento, querem demais, no outro, aceitam querer tão pouco e, quando tentam alguma despretensão e desapego, o fazem de maneira errada, muitas vezes, como diz o anedotário popular, "jogando a água fora com o bebê dentro".

A ideia de "gente como a gente", aliás, é um atestado de mediocridade humana. A cultura brasileira dominante é medíocre, a ponto do máximo de "grandeza musical" se residir em canastrices piegas do nível de Chitãozinho & Xororó. A própria "cultura brega" que tanto se fala e que foi patrulhada até por setores da intelectualidade brasileira (visando mais o potencial comercial desse cenário de mediocridade na nossa cultura) reflete essa visão pejorativa do "gente como a gente".

E onde entra Chico Xavier nessa? Simples. Ele é divinizado, de maneira bastante confusa, por conta de sua trajetória irregular. Ele é o filho do "jeitinho brasileiro", porque, inicialmente, o suposto médium nunca inspirou qualquer tipo de adoração: era o pretenso paranormal que lançou um estranhíssimo livro, Parnaso de Além-Túmulo, que só não foi considerado obra de literatura fake porque naquela época, 1932, não havia Internet.

A trajetória de Chico Xavier não teve o roteiro consistente dos verdadeiros humanistas, mais parecendo o roteiro de um canastrão arrivista que buscava, desesperadamente, vantagens pessoais na vida. Ele contou com um poderoso lobby que, de conveniência em conveniência, o fez o ídolo religioso que é, com a ajuda que incluiu a ditadura militar e uma campanha maciça das Organizações Globo (sim, a famosa corporação dona da Rede Globo de Televisão).

É só ver os incidentes, que demonstram terem sido causados por ele mesmo: revolta de literatos sérios, de católicos honestos, de defensores da democracia, todos incomodados em incidentes nos quais Chico Xavier usurpava os nomes dos mortos, prometia uma "mediunidade" que apresentou falhas graves e inúmeras, e ainda defendeu a ditadura militar como nenhum direitista histérico seria capaz de defender.

Apesar disso, Chico Xavier virou pretensa unanimidade, num Brasil marcado pela burrice a ponto de pesquisadores sérios apontarem o país sul-americano como um dos mais ignorantes do mundo. As próprias pessoas demonstram se conformar com isso: a ignorância virou uma "virtude", além do fato da idiotização humana hoje ter atingido um status de verdadeira tirania.

Os seguidores de Chico Xavier são quase sempre aquelas pessoas "mais ou menos". Sub-intelectualizadas, dessas que acham que Ciência é uma gororoba cognoscitiva que mistura conceitos superficiais de Física, Química e Filosofia com elementos de Astrologia, Tarologia e outras crenças místicas.

São pessoas que se contentam com sua realidade "mais ou menos" e lutam para que ela permaneça assim, dentro de sua compreensão mediana de mundo e sua rotina de "pessoas a falar de jantar e preocupadas somente em nascer e morrer", como disseram Gilberto Gil e Caetano Veloso em "Panis Et Circensis".

O próprio Chico Xavier foi medíocre em seu perfil. Feioso, franzino, ultraconservador, de visual cafona, retrógrado, caipira, de ideias medievais, mas que foi glorificado pelos seus seguidores porque em sua mediocridade os beatos, além dos seguidores mais "distanciados", como os "isentões" e até os "não-espíritas", se espelharam na mediocridade do seu ídolo que, mesmo com ideias dignas de século XIX, foi promovido a "dono do futuro dos brasileiros" através de alegações de pura cegueira emocional.

Chico Xavier deturpou o Espiritismo e o rebaixou a um sub-Catolicismo de moldes medievais. Um "catolicismo" cafajeste se tornou o "espiritismo" brasileiro, que dispensa das pessoas a ginástica de sentar e levantar das missas católicas, mas as coloca num rol de limitações humanas que faz os devotos e simpatizantes de Chico Xavier se desapegarem do que lhes é mais essencial e necessário, enquanto se apegam desesperadamente ao que lhes é supérfluo e até nocivo, por isso lhes representar uma realidade supostamente "pé no chão", "gente como a gente".

As pessoas nem sabem por que estão defendendo Chico Xavier. Certas correntes até aceitam, mas têm dificuldades de dizer por que Chico Xavier é "cientista ou filósofo", e sua mediocridade intelectual é aceita e até estimulada no mercado literário, marcando presença, infelizmente, em tudo quanto é feira literária realizada em nosso país.

As pessoas são desinformadas mas muitos têm uma mania de se passarem por pretensos intelectuais, para defender suas convicções quase nunca coerentes. É só dar uma coceira para despejar um monte de comentários nas redes sociais, de qualquer forma, de uma mensagem pedante num espaço de comentários nas redes sociais até um blog inteiro. Tudo para manter o establishment e sem medir escrúpulos em brigar com os fatos.

Porque as pessoas brigam com os fatos, medrosas em ver a mediocridade sua de cada dia ser posta sob risco. Quantos "efeitos manada" - "unanimidade" forjada quando ideias e atitudes inconvenientes ganham aparente adesão popular - acontecem diante de tantas falácias, pelo simples motivo de que as pessoas preferem viver nos seus problemas do que resolvê-los, preferindo reclamar pelas costas do que executar alguma solução?

Quantas pessoas tentam resolver, por outro lado, e são atacadas nas redes sociais, através de reclamações confusas, de pessoas que nem sabem o que estão dizendo, mas ficam escrevendo comentários irritados nas redes sociais e despejando "não-curtidas" (dislikes) sem mesmo se darem conta de por que fazem isso.

Daí ser compreensível ver um político como o ex-presidente Lula ser muito mais hostilizado que o "médium" Chico Xavier - que, lembremos, tinha uma orientação ideológica diametralmente oposta à do petista - , porque o famoso político, hoje preso em Curitiba por motivos infundados, quis avançar nas medidas de ajuda ao próximo que estavam atingindo os privilégios das elites ricas.

No caso de Chico Xavier, isso não ocorre. Tanto que é a sua caridade que é desprovida de provas, sem que algum resultado concreto fosse apresentado em dados precisos e sob fundamentação teórica. É até engraçado que os seguidores de Chico Xavier exigem fundamento excessivo para teorias que contestam sua "mediunidade", mas aceitam reconhecer sua suposta caridade sem esboçar um pingo de fundamentação de dados sobre o assunto.

O que Chico Xavier fez, quando muito, foi Assistencialismo barato. Aliás, nem ele realmente fez, porque quem fez foram seus seguidores. Isso é duplamente lamentável, pelo nível fajuto da caridade e por ela ter sido feita por terceiros. Mais ou menos como os quadros "assistenciais" do Caldeirão do Huck. Só que, nos tempos de Chico Xavier no seu auge, não havia Internet para mostrar uma informação que fosse contrária aos dados oficiais.

A "caridade" de Chico Xavier é um exemplo da mediocridade brasileira. Resultados medíocres de mero "alívio da dor", sem que curasse a "doença da pobreza", com pobres assistidos mas mantidos em sua condição subserviente e sem grandes benefícios. Além disso, muitos adoram a "caridade" de Chico Xavier porque ela não mexe num centavo sequer nos privilégios das elites, que estão liberadas para promover o bom-mocismo quando lhes bem convierem.

Desse modo, muitos ficam exaltando os espetáculos das "caravanas" de Chico Xavier com donativos e mantimentos, que carregam, em muitos desses objetos, alimentos com marcas ruins e qualidade duvidosa, roupas rasgadas, mofadas ou fora de moda, tudo isso embalado em sacolas de supermercados ou butiques a título de "generosidade".

Quando se fala que a ideia de "caridade" tem esse lado sombrio, muitos não entendem e, no impulso de escrever o que não devem, publicam complicados ensaios sobre o "absurdo" que julgam dessa ideia. Esquecem que o bom-mocismo pode mesmo transformar a ideia de "generosidade" e "altruísmo" em ações traiçoeiras visando a promoção social.

A mediocridade humana se torna, então, um grande engodo de ideias, intenções, desejos e perspectivas que fazem o Brasil mergulhado na sua eterna crise existencial, capaz de aceitar um governo desastroso como o de Jair Bolsonaro sem qualquer resistência ativa. E os brasileiros preferem abrir mão do que eles foram ou desejam de melhor, preferindo viver no limite dos prejuízos, perdas e obstáculos que consideram "suportáveis".