Chico Xavier foi mesmo colaborador da ditadura militar


Juntando as peças de um grande quebra-cabeça, constatamos que o "médium" Francisco Cândido Xavier colaborou, mesmo, com a ditadura militar. Essa constatação não se dá por calúnia nem por qualquer outro fim de inveja ou depreciação, mas adotando o método de raciocínio recomendado por Allan Kardec e um senso de apuração que se torna cada vez mais raro no Brasil.

Em primeiro lugar, se a Escola Superior de Guerra homenageou Chico Xavier, não seria por outra coisa senão que o "médium" teria colaborado para a defesa e manutenção do regime, e as teorias que tentam refutar essa hipótese são muito frágeis e esbarram em contradições. Vejamos:

1) "A Escola Superior de Guerra se aproveitou do prestígio religioso de Chico Xavier para homenageá-lo e o "médium" usava o apoio à ditadura militar para evitar ser preso e torturado":

Essa tese não se sustenta porque, em primeiro lugar, num período de radicalização da repressão militar (autorizado pelo AI-5), a Escola Superior de Guerra não teria "minutos de humanismo" pegando carona num mito religioso nem iria tirar vantagem em um "homem bom" para melhorar a imagem institucional na sociedade.

Comprometido com o rigor repressivo, a ESG, que nem era conhecida dos brasileiros comuns senão de forma vaga, não tinha preocupação em ser "querida pela sociedade". Até porque o fato dela ser odiada ou desprezada por amplos setores da sociedade brasileira lhe permitiria maior liberdade de ação, sem prestar contas à nação.

Com seu rigor militar repressivo, a ESG também não gastaria tempo nem dinheiro com homenagens, produzindo prêmios (como troféus, medalhas e diplomas) nem oferecendo seus aposentos para homenagear quem não estivesse colaborando com o regime ditatorial. Neste caso, se a ESG fez homenagem a Chico Xavier, não devemos subestimar esse fato, pois a instituição viu no "médium" um legítimo colaborador na defesa da ditadura militar.

2) "Chico Xavier teria sido estratégico ao defender a ditadura militar visando evitar que ele e o 'movimento espírita' sofressem qualquer tipo de repressão":

Se essa hipótese tivesse sido verdadeira, não haveria a demonstração escancarada que se deu, pois, se isso era um "jogo de cena" de Chico Xavier, ele não teria se expressado da forma como expressou, defendendo a ditadura militar de maneira convicta e enfática, a ponto de usar o nome de um poeta abolicionista, Castro Alves, para uma suposta psicografia defendendo as Forças Armadas, engajadas num projeto político que inclui a defesa de um modelo de trabalho escravagista.

Embora apresente os aspectos comuns dos acordos entre a "Federação Espírita Brasileira" com o Estado Novo (tratados com a pessoa do chefe do Departamento de Imprensa e Propaganda, Lourival Fontes), como o acordo político para evitar repressão ao "movimento espírita", tal tese não faz o menor sentido no caso da ditadura militar, por ser um outro contexto, bem diferente ao daquela fase do varguismo.

A atitude de Chico Xavier, que contraria sua imagem de "humanista" e "pacifista", apoiando opressores e recebendo homenagem de uma instituição com "guerra" no nome, não teria somente o fim de evitar a repressão, mas também manifestava a identificação do "médium" com o projeto político ditatorial. A ideia causa estranheza em muitos, mas a História já registra alianças entre movimentos religiosos e ditaduras sanguinárias.

"Conheces todos os segredos da sua alma? Além disso, sem ser vicioso ele pode ser leviano e frívolo", é o que revela a Doutrina dos Espíritos no livro seminal O Livro dos Médiuns, de Allan Kardec, quando se pede cautela quando acreditar na "perfeição" ou "quase perfeição" de um "médium". E isso diz muito ao aspecto negativo do apoio à ditadura militar, um aspecto que fez Chico Xavier fez um "médium de direita" mais radical até do que Divaldo Franco e Robson Pinheiro.

CHICO XAVIER FOI CONSERVADOR ATÉ O FIM DA VIDA

A própria imagem "bondosa" de Chico Xavier que hoje conhecemos é um produto da ditadura militar, reproduzindo o método de promoção de falsos santos que o inglês Malcolm Muggeridge usou para favorecer Madre Teresa de Calcutá. Até a "peregrinação" e as "cartas consoladoras" - como um pastiche grosseiro de Paulo de Tarso na Antiguidade - foram uma herança da propaganda muggeridgiana que fez Chico Xavier antecipar Luciano Huck nas ações de pretensa caridade.

A "caridade" de Chico Xavier é tão duvidosa que suas ideias se chocam com a "indiscutível caridade", porque sempre apelam para os sofredores suportarem, em silêncio e sem queixumes, as adversidades pesadas da vida. Adepto da Teologia do Sofrimento - que o "espiritismo" brasileiro nunca assumiu formalmente, mas expressou através das ideias - , Chico Xavier apelava para os oprimidos permanecerem no infortúnio até que o "socorro de Deus" venha resolver a situação.

Portanto, são ideias ultraconservadoras que fazem com que Chico Xavier seja, por suas ideias, identificado por conceitos equivalentes aos existentes em projetos como a "reforma trabalhista" de Michel Temer e Jair Bolsonaro, a "cura gay" de Marco Feliciano e a Escola Sem Partido de Miguel Najib e Magno Malta. Sim, foi Chico Xavier que antecipou isso, conforme vemos em amostras trazidas pelas próprias palavras do "médium" (mesmo aquelas creditadas supostamente aos mortos).

Há correntes entre seguidores de Chico Xavier que alegam que ele "defendeu a ditadura, sim", mas "se arrependeu". Não há uma prova a respeito disso, e o "médium" acreditava, apenas, que a redemocratização só seria "se Deus quisesse".

Alguns chiquistas, como os "isentões", dizem que o Chico Xavier pós-ditadura era apenas um "democrata sem ideologias". Os "espíritas de esquerda" acham que Chico Xavier se "arrependeu" até do apoio a Fernando Collor e, no fim da vida, teria "apoiado a candidatura de Lula", umas fake news que não fazem o menor sentido.

Afinal, como todo conservador, Chico Xavier acreditava que a velhice era um período de experiência consolidada e que não permitia mudanças drásticas de personalidade. Ele não teria virado um "isento" nem "esquerdista", tendo mantido o direitismo que o consagrou no Pinga Fogo - expresso quando ele tinha 61 anos, fase considerada, em 1971, como começo da velhice - até o fim da vida, manifestando, inclusive, horror à figura política do hoje ex-presidente Lula.

Juntando essas peças todas, podemos garantir que Chico Xavier colaborou, sim, com a ditadura militar. A Escola Superior de Guerra, naquele período de repressão radical, não iria perder tempo homenageando quem não colaborasse com a ditadura militar. E Chico Xavier, se tivesse usado uma estratégia de mera sobrevivência pessoal, não teria escancarado seu direitismo conservador diante de grandes multidões, com tamanha convicção.

Daí a conclusão descrita no título desta postagem, que mostra uma ideia muito dolorosa, mas bastante realista, de acordo até mesmo com as raízes e a formação social conservadoras do "médium", que, mais do que apoiar a ditadura militar, teve decisiva colaboração em favor da mesma.