"Espiritismo" brasileiro tornou-se uma religião de ressentidos
CONCEITOS DE "BELEZA" DEFENDIDOS PELOS "ESPÍRITAS" MAIS PARECEM COISAS APROPRIADAS PARA PESSOAS RESSENTIDAS, DEPRIMIDAS E DE BAIXA AUTO-ESTIMA.
Hoje, em tempos de isolamento social, a realidade cobra, com maior intensidade do que antes, os posicionamentos pessoais dos brasileiros, o que realmente querem na vida, se suas posições e seus interesses têm alguma motivação ou se eles são uma opção bastante equivocada de vida.
As pessoas não querem abrir mão de certas pretensões. Como, por exemplo, nos movimentos políticos e culturais de esquerda, onde têm muita gente de direita escondida, gente que "precisa ser esquerdista", mas guarda preconceitos culturais direitistas, vê o povo pobre como um coletivo de animaizinhos de rua a serem domesticados e anestesiados, ainda que tratados de forma aparentemente positiva.
É aí que as esquerdas se deixam iludir tanto com o "funk", por causa do entretenimento que deixa os pobres "felizes", e o "espiritismo" de Francisco Cândido Xavier, cuja "caridade" também deixa os pobres "felizes". O grande problema é que se essa "felicidade" não seria o anestesiamento psicológico para as condições de inferioridade social do povo pobre, que não são adequadamente superadas.
Afinal, o "funk" glamouriza a pobreza e a "maravilhosa obra" de Chico Xavier trata o pobre de maneira paternalista, sem que superasse as condições de subserviência simbólicas. Mesmo a relativa emancipação social, como a prometida por ambientes como a Mansão do Caminho, fundada pelo "médium" Divaldo Franco, não dispensa a pessoa de condições de inferioridade social, sobretudo a submissão religiosa e as ideias conservadoras aprendidas.
Muitos não imaginam que o "espiritismo" brasileiro é conservador em sua própria natureza. Se espantam com o conservadorismo notado por "setores do espiritismo", como se o conservadorismo se desse por conta de alguma invasão alienígena do mal.
Muita gente no Brasil, e podemos dizer, infelizmente, a grande maioria das pessoas, ao ver o "espiritismo", confundem a embalagem com o conteúdo. Acham que o "pacote espírita" é igual ao Espiritismo original francês, e nem abrem o pacote, julgando o conteúdo pela embalagem. Mas é só ver o conteúdo que se perceberá que, por mais que Allan Kardec seja bajulado o tempo todo, é Jean-Baptiste Roustaing que dita os postulados defendidos pelos brasileiros.
Difícil aceitar isso. O "espiritismo" brasileiro se diz racional, mas é a religião mais irracional que se tem no país. Pior até do que os neopentecostais, com suas burrices terraplanistas e obscurantistas, até porque estas são defendidas com maior sinceridade e consciência, os bolsonaristas podem brigar com todo mundo, mas estão em paz consigo mesmos, ao assumir seu reacionarismo e seu obscurantismo. Daí o estranho, preocupante mas compreensível empoderamento de Jair Bolsonaro e companhia.
Os "espíritas", não. Brigam com suas próprias ideias, entram em contradição o tempo todo. Nas redes sociais, briga-se mais sob o véu do Espiritismo do que sob a marquise da Igreja Universal do Reino de Deus, e mesmo entre seguidores de Chico Xavier há brigas internas mais do que dentro do bolsonarismo, vide o caso das atribuições da "profecia da data-limite". Até as recentes brigas dos seguidores de Jair Bolsonaro e Sérgio Moro são fichinha diante dos conflitos internos de chiquistas.
O "espiritismo" é o retrato de um Brasil dissimulado e contraditório, que não tem vontade de resolver as contradições internas da alma, um engodo que mistura falsa modéstia, ambições desmedidas, desejo de promoção pessoal, vergonha de assumir os piores defeitos, só admitindo alguns para dizer que é "gente como a gente".
RAZÕES DO RESSENTIMENTO
O "espiritismo" brasileiro é uma religião de ressentidos porque sua raiz doutrinária se baseia no Roustanguismo, que, aqui, adaptado por Chico Xavier - nunca devemos esquecer que, apesar do medo do "médium" de assumir-se roustanguista, sua obra literária é fortemente influenciada pela obra de Roustaing - , ganhou o eufemismo, carregado de profunda hipocrisia, de "kardecismo".
Pode parecer ridículo, mas quando se fala em "espiritismo kardecista", não se refere à compreensão brasileira da Codificação original, mas uma forma eufemística de definir o Roustanguismo com tempero brasileiro, as ideias de Jean-Baptiste Roustaing temperadas com a "culinária religiosa" de Pedro Leopoldo.
Isso fez do "espiritismo" uma religião de intelectuais frustrados. Católicos medievais, inseguros em abandonar seus dogmas e horrorizados com as mudanças sofridas pela Igreja Católica, decidiram se refugiar numa novidade que lhes serve de esconderijo para suas frustrações intelectuais, nas quais querem disfarçar seu obscurantismo, ao passo que não querem também acolher abertamente o cientificismo kardeciano, antes aceitando seus postulados de maneira condicional e limitada.
O sociólogo Jessé Souza, sabiamente, cita em seus livros que o Brasil tem a tendência de acolher novidades de maneira limitada e restringida por valores pré-modernos que não são rompidos. Pelo contrário, a novidade é que se adapta às condições pré-modernas, mesmo quando se recicla o obsoleto através de um verniz novo.
No Espiritismo, isso não foi exceção. Aqui a novidade se condicionou pelos padrões do Catolicismo jesuíta que vigorou no período colonial, e que tinha uma essência medieval. O rótulo "espiritismo" virou um refúgio para católicos que não aceitaram as mudanças graduais que a Igreja Católica estava sofrendo, pois mesmo os movimentos jesuítas, do século XVI, estavam acolhendo as ideias reformistas que desagradaram a "velha guarda".
Mas como em tudo existe pretensiosismo, a "velha guarda" católica, até para desviar as atenções para as mudanças do Catolicismo - que continuava conservador, mas estabelecia, aos poucos, suas brechas a partir do século XIX - , precisava "ser mais realista que o rei" e, até hoje, o "espiritismo" brasileiro exibe um verniz de progressismo, modernidade e grandeza que oculta sua verdadeira natureza obscurantista que, com certeza, deixaria Allan Kardec profundamente envergonhado e aflito.
A partir daí, com o "espiritismo" brasileiro fundamentado nas ideias de Roustaing - introduzidas por Adolfo Bezerra de Menezes, em detrimento de um hoje descartado Afonso Angeli Torteroli que queria manter as bases kardecianas originais - , atraiu-se uma "plêiade" de pessoas frustradas sob diversos aspectos.

A "FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA", DURANTE O PACTO ÁUREO DE 1949 (NO ALTO), AINDA IMITAVA, DE MANEIRA SOBERBA, AS POSES DOS MEMBROS DA ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, AQUI EM FOTO DE 1897.
O "espiritismo" brasileiro virou uma "marquise intelectual" de acadêmicos frustrados. Nos primórdios do "movimento espírita", seus membros repetiam as mesmas poses dos integrantes da Academia Brasileira de Letras, que havia sido fundada em 1897, 13 anos depois da "Fundação Espírita Brasileira". A FEB, aparentemente, nunca ofereceu um intelectual para ocupar as cadeiras da ABL, o que deve ter criado um ressentimento por parte dos "intelectuais espíritas".
Foi isso, talvez, que permitiu que Chico Xavier, estereotipado como um caipira conservador que "atraiu para si as melhores almas literárias" - uma falácia que, contraditoriamente, se fundamentava pela "inocente ignorância" do "médium" - , usurpasse o nome de Humberto de Campos, como uma revanche para uma crítica pouco amistosa ao livro Parnaso de Além-Túmulo. Aliás, foi neste livro "mediúnico" em que se leu um "Olavo Bilac" desprovido do seu talento original.
MÁS ENERGIAS E ADESÃO MOTIVADA PELA DOR
O "espiritismo" brasileiro, a partir daí, atraiu para si físicos frustrados, juristas frustrados, pessoas que não conseguem discernir Astronomia com Astrologia, pessoas que entendem a Psicologia sob o viés do Esoterismo, pessoas de um nível intelectual bastante confuso, embora pretensioso.
Existe até mesmo dramaturgas e romancistas frustradas que usam do "espiritismo" para retirar, da gaveta, rascunhos de romances modernos e outros de romances de época ruins, e daí criam "romances espíritas" recheados de valores moralistas conservadores, que, embora malfeitos, conseguem um relativo sucesso que, em condições normais (ou diante de gente melhor informada), não teriam o menor pingo de êxito.
Daí que o "espiritismo" se define como a "grandeza" dos frustrados. A religião é conduzida por pessoas frustradas de toda espécie. Gente que não consegue alcançar ideias de grandeza verdadeiros, mesmo os da simplicidade humana, e sofrem algum tipo de frustração de qualquer espécie.
É conhecida a frase, falada no "meio espírita" de que "se as pessoas não se tornam espíritas por amor, se tornam espíritas pela dor", e este segundo caso é o mais comum. Afinal, é através de sensações como a desilusão e a depressão, mal digeridos pela mente, que faz as pessoas, conformistas com o próprio sofrimento, e geralmente dotadas de abnegação mórbida - quando se renuncia ao que é positivo e necessário para a própria pessoa - aderem a essa religião conservadora.
Isso atrai, sobretudo, espíritos inferiores, também identificados com a aceitação do sofrimento humano, que não raro dá um sinal verde para a opressão, afinal, o "espiritismo" brasileiro é uma religião na qual os oprimidos se resignam com a sua condição e, por isso, se envolvem em falsas perspectivas de grandeza, marcadas por uma discreta e nunca assumida ojeriza à vida material, apesar de toda defesa discursiva "em favor da vida".
Daí que as energias dos seguidores do "espiritismo" se tornam negativas, atingindo sobretudo parentes e amigos que fossem dotados de aparência e personalidade mais atrativas e positivas. Jovens atraentes e espirituosas são vítimas de tragédias precoces, assim como pessoas dotadas de talentos intelectuais ímpares e habilidades pessoais incomparáveis.
Não é raro, em muitas famílias "espíritas", que a saudável filha de uma beata "espírita" morra cedo, em detrimento daquele irmão viciado em drogas, que agride os familiares, e que nunca sofre sequer uma overdose.
A ideia de aceitação do sofrimento extremo, sem queixumes, tônica do ultraconservadorismo "espírita", do qual os autoproclamados "espíritas de esquerda", assim como certos esquerdistas laicos ou mesmo os "isentões", fazem vista grossa, desenvolve essas más vibrações, nas quais não se suporta que qualidades positivas e grandiosas se expressem na vida humana.
Por isso é que os "espíritas" se atraem, mesmo sem perceber, a tudo que é mórbido, repugnante, depressivo. O padrão de "lindas histórias" tão defendido pelos "espíritas" se baseia, na verdade, em relatos trágicos de protagonistas que até sobreviveram aos piores infortúnios, mas tiveram prejuízos irreparáveis.
As pessoas falam tanto que a ideia do sofrimento defendida por Chico Xavier é "passageira", mas pegaram a narrativa só pelo final, uma vez que, segundo seu pensamento, de viés surpreendentemente conservador, ele pedia para as pessoas sofrerem caladas e não se queixassem. Além disso, é fácil dizer que "tudo passa" para alguém que perdeu tudo por um infortúnio. Para o "médium", pimenta nos olhos dos outros é refresco. A pessoa é que crie um novo olhar sob a ardência incômoda nos olhos.
Vejam que tudo que é considerado "belo" e "edificante" para os "espíritas" lembra um cenário de "terra arrasada" e sua resignação com aspectos de feiura e mediocridade aos quais forjam supostas grandezas. O "espírita" é uma pessoa com baixa auto-estima, vive num grande complexo de inferioridade, o que traz, como reação psicológica, a mania de grandeza que, não raro, produz pessoas altamente reacionárias.
Chico Xavier era um reacionário convicto e incurável. Seus seguidores também são reacionários, apreciam à distância à "alta cultura" da qual sentem inveja, veem com inveja pessoas bonitas, ou, se não for o caso, pessoas de caráter mais diferenciado, e se ressentem de não ser como elas.
Daí que os "espíritas" sentem um horror, em níveis umbralinos e trevosos - apesar da aparente "luminosidade da alma" - , a tudo que é belo, inteligente, sensato e coerente, apesar de tantas dissimulações que tentem mostrar o contrário. No fundo, os "espíritas" apostam, sim, num padrão de vida "nem tão genial e nem tão belo assim", como se isso fosse realismo. Mas não é realismo, é simplesmente mediocridade.
Criam um padrão de mediocridade, tipo "gente como a gente", e "isentões" surgem como grama na relva para adotar um discurso de "imparcialidade" para deixar o Brasil nos padrões de vida medíocre, criando uma falsa grandeza naquilo que se situa entre o mediano e o rasteiro.
A hipocrisia mora no "espiritismo" brasileiro. Mora tanto que o hipócrita é o primeiro a renegar a sua hipocrisia, com o nervosismo que desmascara mil desmentimentos. O fato de que as energias "espíritas" são as que mais protegem os políticos golpistas pós-2016 - como, atualmente, o presidente Jair Bolsonaro, "flagrado" com um livro de Chico Xavier, Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho (semelhante ao lema "Brasil, Acima de Tudo, Deus, Acima de Todos) - irrita os ditos "espíritas de esquerda".
Isso porque os hipócritas, aqueles que se aventuram em mil pretensões, pegando carona em vanguardas e grandezas das quais não têm a natural vocação - nota-se, por exemplo, direitismos ocultos nos "espíritas esquerdistas" Franklin Félix e Ana Cláudia Laurindo, no fundo optando pela pretensão progressista para obterem vantagens pessoais.
Afinal, de que adianta saltar da cadeira e renegar Jair Bolsonaro, se quando o vê o coração bate mais forte? Nas esquerdas há muita gente de direita bajulando LGBTQ e fazendo vista grossa, no caso "espírita", quando Chico Xavier rejeitava o movimento camponês em declarações próprias feitas para uma gigantesca audiência do Pinga Fogo, com milhares de testemunhas sabendo do reacionarismo confesso do "médium", mais radical do que muito "espírita de direita" de hoje em dia.
O que vemos são pessoas embarcando em causas avançadas apenas porque "isso é legal" e trará "mais vantagens pessoais". Tantos reacionários, tantos conservadores de carteirinha, se travestem de "esquerdistas", "alternativos", "vanguardistas" apresentando, na hora H, seus pontos de vista obscurantistas, seu moralismo retrógrado em diversos níveis. Daí a confusão mental de tantas pessoas, como gays homofóbicos, mulheres machistas e negros racistas contra sua própria raça.
É fácil Ana Cláudia Laurindo falar das "sombras ocultas" dos outros. Fácil o "espírita" falar dos argueiros dos olhos dos neopentecostais, que, por mais negativos que fossem, ultrapassaram o "espiritismo" brasileiro em torno de honestidade doutrinária. Afinal, seitas como a Igreja Universal do Reino de Deus defendem valores retrógrados, mas eles são bem sinceros nesta postura, diante dos "espíritas" que, por sua vez, traem Allan Kardec o tempo todo e fingem jurar fidelidade a ele.
Daí que, junto ao intelectualismo frustrado dos "espíritas" e junto a uma inveja inconsciente às grandezas verdadeiras, também se acrescenta a dissimulação, o que faz com que a sinceridade não é uma boa amiga do "espiritismo" brasileiro.
A pretensão, a falsa modéstia e o medo de assumir os piores defeitos - a não ser pela carteirada por baixo do "todo mundo erra" e "todos somos imperfeitos" - faz do "espírita" uma pessoa desonesta, e a pior desonestidade que ele faz, além de fazer a desonestidade para outrem, principalmente nas traições feitas à Codificação, é consigo mesmo, quando, em nome das vantagens pessoais diversas, se deixa de ser sincero com si mesmo, o que coloca os "espíritas" em situações cada vez piores.
Hoje, em tempos de isolamento social, a realidade cobra, com maior intensidade do que antes, os posicionamentos pessoais dos brasileiros, o que realmente querem na vida, se suas posições e seus interesses têm alguma motivação ou se eles são uma opção bastante equivocada de vida.
As pessoas não querem abrir mão de certas pretensões. Como, por exemplo, nos movimentos políticos e culturais de esquerda, onde têm muita gente de direita escondida, gente que "precisa ser esquerdista", mas guarda preconceitos culturais direitistas, vê o povo pobre como um coletivo de animaizinhos de rua a serem domesticados e anestesiados, ainda que tratados de forma aparentemente positiva.
É aí que as esquerdas se deixam iludir tanto com o "funk", por causa do entretenimento que deixa os pobres "felizes", e o "espiritismo" de Francisco Cândido Xavier, cuja "caridade" também deixa os pobres "felizes". O grande problema é que se essa "felicidade" não seria o anestesiamento psicológico para as condições de inferioridade social do povo pobre, que não são adequadamente superadas.
Afinal, o "funk" glamouriza a pobreza e a "maravilhosa obra" de Chico Xavier trata o pobre de maneira paternalista, sem que superasse as condições de subserviência simbólicas. Mesmo a relativa emancipação social, como a prometida por ambientes como a Mansão do Caminho, fundada pelo "médium" Divaldo Franco, não dispensa a pessoa de condições de inferioridade social, sobretudo a submissão religiosa e as ideias conservadoras aprendidas.
Muitos não imaginam que o "espiritismo" brasileiro é conservador em sua própria natureza. Se espantam com o conservadorismo notado por "setores do espiritismo", como se o conservadorismo se desse por conta de alguma invasão alienígena do mal.
Muita gente no Brasil, e podemos dizer, infelizmente, a grande maioria das pessoas, ao ver o "espiritismo", confundem a embalagem com o conteúdo. Acham que o "pacote espírita" é igual ao Espiritismo original francês, e nem abrem o pacote, julgando o conteúdo pela embalagem. Mas é só ver o conteúdo que se perceberá que, por mais que Allan Kardec seja bajulado o tempo todo, é Jean-Baptiste Roustaing que dita os postulados defendidos pelos brasileiros.
Difícil aceitar isso. O "espiritismo" brasileiro se diz racional, mas é a religião mais irracional que se tem no país. Pior até do que os neopentecostais, com suas burrices terraplanistas e obscurantistas, até porque estas são defendidas com maior sinceridade e consciência, os bolsonaristas podem brigar com todo mundo, mas estão em paz consigo mesmos, ao assumir seu reacionarismo e seu obscurantismo. Daí o estranho, preocupante mas compreensível empoderamento de Jair Bolsonaro e companhia.
Os "espíritas", não. Brigam com suas próprias ideias, entram em contradição o tempo todo. Nas redes sociais, briga-se mais sob o véu do Espiritismo do que sob a marquise da Igreja Universal do Reino de Deus, e mesmo entre seguidores de Chico Xavier há brigas internas mais do que dentro do bolsonarismo, vide o caso das atribuições da "profecia da data-limite". Até as recentes brigas dos seguidores de Jair Bolsonaro e Sérgio Moro são fichinha diante dos conflitos internos de chiquistas.
O "espiritismo" é o retrato de um Brasil dissimulado e contraditório, que não tem vontade de resolver as contradições internas da alma, um engodo que mistura falsa modéstia, ambições desmedidas, desejo de promoção pessoal, vergonha de assumir os piores defeitos, só admitindo alguns para dizer que é "gente como a gente".
RAZÕES DO RESSENTIMENTO
O "espiritismo" brasileiro é uma religião de ressentidos porque sua raiz doutrinária se baseia no Roustanguismo, que, aqui, adaptado por Chico Xavier - nunca devemos esquecer que, apesar do medo do "médium" de assumir-se roustanguista, sua obra literária é fortemente influenciada pela obra de Roustaing - , ganhou o eufemismo, carregado de profunda hipocrisia, de "kardecismo".
Pode parecer ridículo, mas quando se fala em "espiritismo kardecista", não se refere à compreensão brasileira da Codificação original, mas uma forma eufemística de definir o Roustanguismo com tempero brasileiro, as ideias de Jean-Baptiste Roustaing temperadas com a "culinária religiosa" de Pedro Leopoldo.
Isso fez do "espiritismo" uma religião de intelectuais frustrados. Católicos medievais, inseguros em abandonar seus dogmas e horrorizados com as mudanças sofridas pela Igreja Católica, decidiram se refugiar numa novidade que lhes serve de esconderijo para suas frustrações intelectuais, nas quais querem disfarçar seu obscurantismo, ao passo que não querem também acolher abertamente o cientificismo kardeciano, antes aceitando seus postulados de maneira condicional e limitada.
O sociólogo Jessé Souza, sabiamente, cita em seus livros que o Brasil tem a tendência de acolher novidades de maneira limitada e restringida por valores pré-modernos que não são rompidos. Pelo contrário, a novidade é que se adapta às condições pré-modernas, mesmo quando se recicla o obsoleto através de um verniz novo.
No Espiritismo, isso não foi exceção. Aqui a novidade se condicionou pelos padrões do Catolicismo jesuíta que vigorou no período colonial, e que tinha uma essência medieval. O rótulo "espiritismo" virou um refúgio para católicos que não aceitaram as mudanças graduais que a Igreja Católica estava sofrendo, pois mesmo os movimentos jesuítas, do século XVI, estavam acolhendo as ideias reformistas que desagradaram a "velha guarda".
Mas como em tudo existe pretensiosismo, a "velha guarda" católica, até para desviar as atenções para as mudanças do Catolicismo - que continuava conservador, mas estabelecia, aos poucos, suas brechas a partir do século XIX - , precisava "ser mais realista que o rei" e, até hoje, o "espiritismo" brasileiro exibe um verniz de progressismo, modernidade e grandeza que oculta sua verdadeira natureza obscurantista que, com certeza, deixaria Allan Kardec profundamente envergonhado e aflito.
A partir daí, com o "espiritismo" brasileiro fundamentado nas ideias de Roustaing - introduzidas por Adolfo Bezerra de Menezes, em detrimento de um hoje descartado Afonso Angeli Torteroli que queria manter as bases kardecianas originais - , atraiu-se uma "plêiade" de pessoas frustradas sob diversos aspectos.

A "FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA", DURANTE O PACTO ÁUREO DE 1949 (NO ALTO), AINDA IMITAVA, DE MANEIRA SOBERBA, AS POSES DOS MEMBROS DA ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, AQUI EM FOTO DE 1897.
O "espiritismo" brasileiro virou uma "marquise intelectual" de acadêmicos frustrados. Nos primórdios do "movimento espírita", seus membros repetiam as mesmas poses dos integrantes da Academia Brasileira de Letras, que havia sido fundada em 1897, 13 anos depois da "Fundação Espírita Brasileira". A FEB, aparentemente, nunca ofereceu um intelectual para ocupar as cadeiras da ABL, o que deve ter criado um ressentimento por parte dos "intelectuais espíritas".
Foi isso, talvez, que permitiu que Chico Xavier, estereotipado como um caipira conservador que "atraiu para si as melhores almas literárias" - uma falácia que, contraditoriamente, se fundamentava pela "inocente ignorância" do "médium" - , usurpasse o nome de Humberto de Campos, como uma revanche para uma crítica pouco amistosa ao livro Parnaso de Além-Túmulo. Aliás, foi neste livro "mediúnico" em que se leu um "Olavo Bilac" desprovido do seu talento original.
MÁS ENERGIAS E ADESÃO MOTIVADA PELA DOR
O "espiritismo" brasileiro, a partir daí, atraiu para si físicos frustrados, juristas frustrados, pessoas que não conseguem discernir Astronomia com Astrologia, pessoas que entendem a Psicologia sob o viés do Esoterismo, pessoas de um nível intelectual bastante confuso, embora pretensioso.
Existe até mesmo dramaturgas e romancistas frustradas que usam do "espiritismo" para retirar, da gaveta, rascunhos de romances modernos e outros de romances de época ruins, e daí criam "romances espíritas" recheados de valores moralistas conservadores, que, embora malfeitos, conseguem um relativo sucesso que, em condições normais (ou diante de gente melhor informada), não teriam o menor pingo de êxito.
Daí que o "espiritismo" se define como a "grandeza" dos frustrados. A religião é conduzida por pessoas frustradas de toda espécie. Gente que não consegue alcançar ideias de grandeza verdadeiros, mesmo os da simplicidade humana, e sofrem algum tipo de frustração de qualquer espécie.
É conhecida a frase, falada no "meio espírita" de que "se as pessoas não se tornam espíritas por amor, se tornam espíritas pela dor", e este segundo caso é o mais comum. Afinal, é através de sensações como a desilusão e a depressão, mal digeridos pela mente, que faz as pessoas, conformistas com o próprio sofrimento, e geralmente dotadas de abnegação mórbida - quando se renuncia ao que é positivo e necessário para a própria pessoa - aderem a essa religião conservadora.
Isso atrai, sobretudo, espíritos inferiores, também identificados com a aceitação do sofrimento humano, que não raro dá um sinal verde para a opressão, afinal, o "espiritismo" brasileiro é uma religião na qual os oprimidos se resignam com a sua condição e, por isso, se envolvem em falsas perspectivas de grandeza, marcadas por uma discreta e nunca assumida ojeriza à vida material, apesar de toda defesa discursiva "em favor da vida".
Daí que as energias dos seguidores do "espiritismo" se tornam negativas, atingindo sobretudo parentes e amigos que fossem dotados de aparência e personalidade mais atrativas e positivas. Jovens atraentes e espirituosas são vítimas de tragédias precoces, assim como pessoas dotadas de talentos intelectuais ímpares e habilidades pessoais incomparáveis.
Não é raro, em muitas famílias "espíritas", que a saudável filha de uma beata "espírita" morra cedo, em detrimento daquele irmão viciado em drogas, que agride os familiares, e que nunca sofre sequer uma overdose.
A ideia de aceitação do sofrimento extremo, sem queixumes, tônica do ultraconservadorismo "espírita", do qual os autoproclamados "espíritas de esquerda", assim como certos esquerdistas laicos ou mesmo os "isentões", fazem vista grossa, desenvolve essas más vibrações, nas quais não se suporta que qualidades positivas e grandiosas se expressem na vida humana.
Por isso é que os "espíritas" se atraem, mesmo sem perceber, a tudo que é mórbido, repugnante, depressivo. O padrão de "lindas histórias" tão defendido pelos "espíritas" se baseia, na verdade, em relatos trágicos de protagonistas que até sobreviveram aos piores infortúnios, mas tiveram prejuízos irreparáveis.
As pessoas falam tanto que a ideia do sofrimento defendida por Chico Xavier é "passageira", mas pegaram a narrativa só pelo final, uma vez que, segundo seu pensamento, de viés surpreendentemente conservador, ele pedia para as pessoas sofrerem caladas e não se queixassem. Além disso, é fácil dizer que "tudo passa" para alguém que perdeu tudo por um infortúnio. Para o "médium", pimenta nos olhos dos outros é refresco. A pessoa é que crie um novo olhar sob a ardência incômoda nos olhos.
Vejam que tudo que é considerado "belo" e "edificante" para os "espíritas" lembra um cenário de "terra arrasada" e sua resignação com aspectos de feiura e mediocridade aos quais forjam supostas grandezas. O "espírita" é uma pessoa com baixa auto-estima, vive num grande complexo de inferioridade, o que traz, como reação psicológica, a mania de grandeza que, não raro, produz pessoas altamente reacionárias.
Chico Xavier era um reacionário convicto e incurável. Seus seguidores também são reacionários, apreciam à distância à "alta cultura" da qual sentem inveja, veem com inveja pessoas bonitas, ou, se não for o caso, pessoas de caráter mais diferenciado, e se ressentem de não ser como elas.
Daí que os "espíritas" sentem um horror, em níveis umbralinos e trevosos - apesar da aparente "luminosidade da alma" - , a tudo que é belo, inteligente, sensato e coerente, apesar de tantas dissimulações que tentem mostrar o contrário. No fundo, os "espíritas" apostam, sim, num padrão de vida "nem tão genial e nem tão belo assim", como se isso fosse realismo. Mas não é realismo, é simplesmente mediocridade.
Criam um padrão de mediocridade, tipo "gente como a gente", e "isentões" surgem como grama na relva para adotar um discurso de "imparcialidade" para deixar o Brasil nos padrões de vida medíocre, criando uma falsa grandeza naquilo que se situa entre o mediano e o rasteiro.
A hipocrisia mora no "espiritismo" brasileiro. Mora tanto que o hipócrita é o primeiro a renegar a sua hipocrisia, com o nervosismo que desmascara mil desmentimentos. O fato de que as energias "espíritas" são as que mais protegem os políticos golpistas pós-2016 - como, atualmente, o presidente Jair Bolsonaro, "flagrado" com um livro de Chico Xavier, Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho (semelhante ao lema "Brasil, Acima de Tudo, Deus, Acima de Todos) - irrita os ditos "espíritas de esquerda".
Isso porque os hipócritas, aqueles que se aventuram em mil pretensões, pegando carona em vanguardas e grandezas das quais não têm a natural vocação - nota-se, por exemplo, direitismos ocultos nos "espíritas esquerdistas" Franklin Félix e Ana Cláudia Laurindo, no fundo optando pela pretensão progressista para obterem vantagens pessoais.
Afinal, de que adianta saltar da cadeira e renegar Jair Bolsonaro, se quando o vê o coração bate mais forte? Nas esquerdas há muita gente de direita bajulando LGBTQ e fazendo vista grossa, no caso "espírita", quando Chico Xavier rejeitava o movimento camponês em declarações próprias feitas para uma gigantesca audiência do Pinga Fogo, com milhares de testemunhas sabendo do reacionarismo confesso do "médium", mais radical do que muito "espírita de direita" de hoje em dia.
O que vemos são pessoas embarcando em causas avançadas apenas porque "isso é legal" e trará "mais vantagens pessoais". Tantos reacionários, tantos conservadores de carteirinha, se travestem de "esquerdistas", "alternativos", "vanguardistas" apresentando, na hora H, seus pontos de vista obscurantistas, seu moralismo retrógrado em diversos níveis. Daí a confusão mental de tantas pessoas, como gays homofóbicos, mulheres machistas e negros racistas contra sua própria raça.
É fácil Ana Cláudia Laurindo falar das "sombras ocultas" dos outros. Fácil o "espírita" falar dos argueiros dos olhos dos neopentecostais, que, por mais negativos que fossem, ultrapassaram o "espiritismo" brasileiro em torno de honestidade doutrinária. Afinal, seitas como a Igreja Universal do Reino de Deus defendem valores retrógrados, mas eles são bem sinceros nesta postura, diante dos "espíritas" que, por sua vez, traem Allan Kardec o tempo todo e fingem jurar fidelidade a ele.
Daí que, junto ao intelectualismo frustrado dos "espíritas" e junto a uma inveja inconsciente às grandezas verdadeiras, também se acrescenta a dissimulação, o que faz com que a sinceridade não é uma boa amiga do "espiritismo" brasileiro.
A pretensão, a falsa modéstia e o medo de assumir os piores defeitos - a não ser pela carteirada por baixo do "todo mundo erra" e "todos somos imperfeitos" - faz do "espírita" uma pessoa desonesta, e a pior desonestidade que ele faz, além de fazer a desonestidade para outrem, principalmente nas traições feitas à Codificação, é consigo mesmo, quando, em nome das vantagens pessoais diversas, se deixa de ser sincero com si mesmo, o que coloca os "espíritas" em situações cada vez piores.