Texto de Chico Xavier, creditado a Emmanuel, tenta desconversar sobre os Inimigos Ocultos do Espiritismo

Em várias passagens de sua obra, Allan Kardec fazia alertas a respeito dos inimigos internos do Espiritismo, alertando que os piores inimigos não estão fora da Doutrina Espírita, mas dentro dela, deturpando o seu legado e corrompendo as suas ideias.
O Brasil é um país marcado pela ignorância, a ponto das pessoas se sentirem mais seguras ao serem ignorantes sobre dados assuntos do que se tivessem pleno conhecimento dos mesmos. Isso é preocupante, pois a transformação da ignorância humana em motivo de orgulho, tipo "ser gente como a gente" (típica desculpa de quem é capaz de fazer carteirada por baixo, passando pano nos próprios defeitos), é que deixou nosso país na condição vulnerável e surreal que hoje enfrentamos.
Daí que o Brasil tornou-se um terreno fértil para as ideias de Jean-Baptiste Roustaing, que foram até testadas por este compatriota de Kardec, mas deturpador feroz da Doutrina dos Espíritos. A catolicização que Roustaing tentou fazer na França, apenas com pálido sucesso, tornou-se tão bem sucedida no Brasil que o sobrenome do autor de Os Quatro Evangelhos pôde até ser sacrificado, enquanto os deturpadores, como aquele personagem Rolando Lero bajulando o professor Raimundo no famoso humorístico de Chico Anysio, ficam bajulando o professor lionês.
Com o nível de compreensão rasteiro da maioria dos brasileiros, em níveis comparáveis aos que quem acha que a letra "Y" é um "V com perninha", pregam-se ideias equivocadas do "inimigo interno", que geralmente é representado por um estereótipo bastante caricatural.
O estereótipo do "inimigo interno" é aquele sujeito, meio corcunda, sisudo e com olhar sombrio e voz sinistra, que aparece escondido numa multidão, ouvindo silenciosamente. É um sujeito pouco cordial, com sorrisos ao mesmo tempo fingidos e brutos, sem expressar uma alegria convincente, por mais teatral que fosse. É um sujeito que age às escondidas, sendo incapaz de conquistar as pessoas, ficando apenas oculto e escondido nas sombras de uma instituição.
Acreditar nessa visão é um grande equívoco. Podemos considerar que, embora isso seja chocante e desagradável, os inimigos internos do Espiritismo sejam Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco e, a partir deles, os seus seguidores diretos e indiretos. Pensar assim corta o coração de muita gente, porque os dois estão associados a uma imagem benevolente e a mensagens supostamente "positivas", e um verniz de generosidade humana que consegue iludir até parte dos esclarecidos.
Tudo isso foi previsto por Kardec. Em vários momentos, ele fala dos aspectos negativos dos inimigos internos do Espiritismo, que não agem sempre de maneira claramente leviana. Até mesmo Erasto alerta sobre as "coisas boas" que, às vezes, espíritos mistificadores (encarnados ou desencarnados) trazem em suas mensagens, mas pede, nestes casos, uma cautela ainda maior, um desconfiômetro ligado mesmo quando um "médium" autor das mensagens aparece cercado de coraçõezinhos e flores.
No mundo desenvolvido, há o reconhecimento do "bombardeio de amor" como perigosa técnica de dominação de uma pessoa. Explora as fraquezas emocionais que, aqui, são vistas como "saudáveis", pois, na "infância" do Brasil, as pessoas gostam de ser emotivas, mesmo que isso tenha o preço trágico de se afogar diante de "cantos de sereias", que não são dados por moças bonitas com corpo de peixe, mas por idosos de aparência repulsiva, mas dotados de poder de sedução pela mística religiosa.
Pode parecer maravilhoso, mas é terrível ver que Chico Xavier e Divaldo Franco correspondem, ao mundo dos adultos e dos idosos, com alcance até mesmo entre aqueles que se dizem com certo nível de esclarecimento, às "princesas da Disney" do imaginário das crianças do sexo feminino, só que de maneira bastante piorada.
Desfazer um adulto de suas próprias fantasias e ilusões lhes causa revolta, e, não raro, produz reações de ódio, rancor e rispidez. Numa discussão entre um seguidor e um opositor de Chico Xavier, o seguidor é o mais desequilibrado emocionalmente. Isso pode parecer absurdo para muitos, mas se explica pelo fato de que a fascinação religiosa deixa a pessoa num estado de transe psicológico, cujo despertar lhe causa profunda irritação, ao ser retirado da zona de conforto da ilusão da fé.
Tais coisas explicam como o êxito dos inimigos internos do Espiritismo se produziu com tanta eficiência no Brasil, causando não só fascinação obsessiva nos adeptos, seguidores ou mesmo em simpatizantes "laicos", incluindo os que se alardeiam "não-espíritas" e os que se autoproclamam "ateus", mas cultuam o "deus" Chico Xavier (deísta radical) além da conta.
Essa obsessão por Chico Xavier chega a provocar subjugação naqueles que deveriam investigá-lo e contestar o seu mito, como acadêmicos de diversas áreas, jornalistas investigativos e juristas de vários setores da Justiça. A subjugação se carateriza da seguinte forma (ver O Livro dos Médiuns, capítulo 23 - da Obsessão, item 240):
240. A subjugação é um envolvimento que produz a paralisação da vontade da vítima, fazendo-a agir malgrado seu. Esta se encontra, numa palavra, sob um verdadeiro jugo.
A subjugação pode ser moral ou corpórea. No primeiro caso, o subjugado é levado a tomar decisões freqüentemente absurdas e comprometedoras que, por uma espécie de ilusão considera sensatas: é uma espécie de fascinação. No segundo caso, o Espírito age sobre os órgãos materiais, provocando movimentos involuntários. No médium escrevente produz uma necessidade incessante de escrever, mesmo nos momentos mais inoportunos. Vimos subjugados que, na falta de caneta ou lápis, fingiam escrever com o dedo, onde quer que se encontre, mesmo nas ruas, escrevendo em portas e paredes.
A subjugação corpórea vai às vezes mais longe, podendo levar a vítima aos atos mais ridículos. Conhecemos um homem que, não sendo jovem nem belo, dominado por uma obsessão dessa natureza, foi constrangido por uma força irrestível a cair de joelhos diante de uma jovem que não lhe interessava e pedi-la em casamento. De outras vezes sentia nas costas e nas curvas das pernas uma forte pressão que obrigava, apesar de sua resistência, a ajoelhar-se e beijar a terra nos lugares públicos, diante da multidão. Para os seus conhecidos passava por louco(2), mas estamos convencidos de que absolutamente não o era, pois tinha plena consciência do ridículo que praticava contra a própria vontade e sofria com isso horrivelmente.
É só aparecer o nome de Chico Xavier em algum questionamento, que acadêmicos, jornalistas e juristas se paralisam. Não se encorajam sequer a apreciar as provas das irregularidades do "médium". Dominados pelo "canto de sereia" do "bondoso médium", eles evitam qualquer questionamento ou tentam desconstrui-lo com relativizações diversas, como, por exemplo, dizer que "é natural que um autor esqueça seu próprio estilo individual numa psicografia".
Isso é o que um inimigo interno do Espiritismo queria fazer: seduzir as pessoas com os mais profundos apelos emocionais para dominá-las completamente, de maneira a evitar qualquer oposição, ou tentar desarmá-la com réplicas, retratações e relativizações. Kardec falava do caso da influência de espíritos desencarnados sobre um médium, no seu exemplo inicial sobre subjugação, mas isso também se aplica na relação da sociedade com um suposto médium que lhes oferece mistificação.
O tipo de subjugação que toma conta de acadêmicos, jornalistas e juristas, a partir do caso de João Frederico Mourão Russell, o juiz suplente do Rio de Janeiro que considerou "improcedente" o processo dos herdeiros de Humberto de Campos, usando como desculpa a ideia de que os direitos autorais de um autor falecido só se referem apenas ao que ele produziu em vida.
Russell se esqueceu que a usurpação do nome de um morto, em pretensas psicografias que lhe fogem ao estilo, e que "às vezes mostram coisas boas", podem representar um desrespeito simbólico à sua imagem, sendo uma violação ainda pior do que reproduzir indevidamente sua obra terrena.
Infelizmente, pela impunidade dada a Chico Xavier, abriu-se caminho para se fazer o que quiser com os mortos. Até, se possível, mensagem "espiritual" de dona Marisa Letícia Lula da Silva pedindo a extinção do Partido dos Trabalhadores, sob a desculpa que o PT, por admirável que fosse, "causou muita dor em boa parte dos brasileiros".
A fascinação obsessiva em torno de Chico Xavier é um triunfo que os inimigos internos do Espiritismo tiveram, a partir do seu inimigo interno maior, glorificado até mesmo por aqueles que, de maneira tendenciosa, fingem renegar o endeusamento do "médium", partindo para a carteirada por baixo do "homem simples e imperfeito".
É isso que faz com que os inimigos internos, para continuarem dominando o Espiritismo, traírem o tempo todo o legado de Kardec e, ainda assim, se arrogarem a fingir-lhe fidelidade absoluta e, como farsantes sofisticados, ainda reivindicar "respeito maior à Doutrina dos Espíritos", um respeito que eles mesmos são os primeiros a deixarem de cumprir.
Para tanto, até a noção do "inimigo interno" é desvirtuada, como se viu no texto de Chico Xavier atribuído a Emmanuel, reproduzido abaixo. O "inimigo interno" se atribuiu a própria pessoa, e isso se encaixa no ultraconservadorismo de Chico Xavier, neste texto que, cinicamente e sob o contexto do AI-5, critica ainda o "medo de sofrer" do suposto "inimigo interno" da individualidade humana.
A ideia, portanto, segue o princípio do "inimigo de si mesmo", que de forma ambígua é acolhida pelo "espiritismo" brasileiro, que diz reprovar o suicídio, mas ignora que essa teoria estimula justamente essa prática, porque o sofredor extremo, desesperado com sua situação, ao ser convidado a "reconhecer o inimigo dentro de si", a primeira coisa que ele vai fazer é tirar a própria vida.
Chama a atenção, também, o contexto da publicação desse texto abaixo , que, além de abafar a questão do "inimigo interno do Espiritismo" - poucos admitem, mas Chico Xavier é o pior e mais traiçoeiro desses inimigos internos, dolorosa realidade comprovada por sua obra - , pede para as pessoas aceitarem o sofrimento e eliminarem a sua individualidade, amaldiçoada por esse recado extremamente moralista.
O texto "Inimigos Ocultos" foi lançado pelo livro com o "bondoso" título de Alma e Coração, lançado em 1969. É o primeiro ano em que o Brasil põe em prática, para valer, o Ato Institucional Número Cinco (AI-5), lançado pela ditadura militar - instaurada por um golpe civil-militar que contou com o apoio convicto de Chico Xavier - , e o texto apela justamente para as pessoas "aguentarem a barra" e abrirem mão até do que precisam da vida.
Embora os "espíritas" saiam por aí desmentindo que defendam o sofrimento humano ou que condenam a individualidade humana, é isso mesmo que eles praticam. E isso está presente neste texto, que em dado momento pode conter alegações "bondosas" de que Deus irá socorrer a pessoa depois do auge da desgraça, algo que é bastante cínico, pois é depois de tudo estar destruído que a "graça divina" chegará à pessoa, quando foi tarde demais.
A ideia de que o sofrimento é "caminho para o progresso" remete à Teologia do Sofrimento, que no "espiritismo" brasileiro vale mais do que os postulados da Codificação. E é uma ideia hipócrita e desumana, porque é dita por um pregador religioso (Chico Xavier), de maneira impiedosa, pouco importando se o sofrimento causa prejuízo a alguém. É mais ou menos uma versão religiosa do ditado popular "pimenta nos olhos dos outros é refresco".
Vamos ler o texto, desde que com muito cuidado, para que as pessoas não sucumbam à paixão religiosa e à fascinação obsessiva e, com base na fé, caiam na tentação do masoquismo religioso.
INIMIGOS OCULTOS
Por Francisco Cândido Xavier - Atribuído ao espírito Emmanuel - Livro Alma e Coração, FEB, 1969
Mencionamos, com muita freqüência, que os inimigos exteriores são os piores expoentes de perturbação que operam em nosso prejuízo. Urge, porém, olhar para dentro de nós, de modo a descobrir que os adversários mais difíceis são aqueles de que não nos podemos afastar facilmente, por se nos alojarem no cerne da própria alma.
Dentre eles, os mais implacáveis são:
- o egoísmo, que nos tolhe a visão espiritual, impedindo vejamos as necessidades daqueles que mais amamos;
- o orgulho, que não nos permite acolher a luz do entendimento, arrojando-nos a permanente desequilíbrio;
- a vaidade, que nos sugere a superestimação do próprio valor, induzindo-nos a desprezar o merecimento dos outros;
- o desânimo, que nos impele aos precipícios da inércia;
- a intemperança mental, que nos situa na indisciplina;
- o medo de sofrer, que nos subtrai as melhores oportunidades de progresso, e tantos outros agentes nocivos que se nos instalam no Espírito, corroendo-nos a energias e depredando-nos a estabilidade mental.
Para a transformação dos adversários exteriores contamos, geralmente, com o amparo de amigos que nos ajudam a revisar relações, colaborando conosco na constituição de novos caminhos; entretanto, para extirpar os que moram em nós, vale tão-somente o auxílio de DEUS, com o laborioso esforço de nós mesmos.
Reportando-nos aos inimigos externos, advertiu-nos JESUS que é preciso perdoar as ofensas setenta vezes sete vezes, e decerto que para nos descartarmos dos inimigos internos prometeu-nos o Senhor: "conhecereis a verdade e a verdade vos fará livres" o que equivale dizer que só estaremos a salvo de nossas calamidades interiores, através de árduo trabalho na oficina da educação.