Ainda sobre o provável apoio de Chico Xavier a Jair Bolsonaro


FOTOMONTAGEM COMPARA JAIR BOLSONARO A CHICO XAVIER. ENQUANTO ISSO, O PRESIDENTE APARECE COM O FAMOSO LIVRO DO "MÉDIUM".

Quem entende de ciência política e do comportamento social consegue entender por que Francisco Cândido Xavier, popularmente conhecido como Chico Xavier, teria apoiado Jair Bolsonaro em 2018, ideia que choca uma boa parcela de "espíritas", inclusive os chamados "espíritas de esquerda", que ingenuamente acreditariam o contrário, que o apoio seria para Fernando Haddad, porque este "é um professor".

"Esquerdizar" a figura de Chico Xavier não possui fundamentação lógica, e se baseia apenas em alegações emocionais, superficiais e vagas, em ideias meramente especulativas e em apelos sentimentais que soam agradáveis, mas nem por isso podem ser considerados realistas. A fé religiosa não pode ter a arrogância de ser uma ilha de fantasias num mar de realidade.

As comparações são muito superficiais através de alegações um tanto tolas, que esquerdistas ingênuos logo pregam sobre os antagônicos Chico Xavier e o ex-presidente Lula. Dizem eles:

"Chico Xavier ajudou os pobres. Lula ajudou os pobres. Chico Xavier defendeu a paz. Lula defendeu a paz. Chico Xavier sonhou com um Brasil melhor. Lula sonhou com um Brasil melhor. Logo, Chico Xavier e Lula são almas gêmeas".

A alegação é bastante agradável e produz até consenso em setores influentes da nossa sociedade. Mas, além do fato de que a "caridade" de Chico Xavier é uma farsa, feita nos mesmos moldes que Luciano Huck teve hoje, as duas comparações são tão ridículas quanto dizer que duas pessoas são afins só porque usam uma mesma marca de tênis e frequentam o mesmo restaurante e o mesmo estádio de futebol.

Não é preciso esforço para entender que é esse o raciocínio torto que faz com que muitos casais, no Brasil, se unam não pela afeição mútua, mas pelos mesmos espaços de lazer frequentados, o que explica o alto índice de feminicídios que acontece porque a verdadeira afinidade pessoal, além de ser menosprezada pela maioria da sociedade, ainda é rejeitada por uma boa parte das pessoas e confundida com "grude" e "apego".

Não imaginamos as coisas por trás das aparências e é insuficiente a atitude de "achar beleza" na feiura física de Chico Xavier, porque não se trata da verdadeira beleza, mas de apelos meramente piegas ligados à religiosidade e ao misticismo, próprios de apelos perigosos como "bombardeio de amor", uma das mais traiçoeiras técnicas de dominação das pessoas. Neste sentido, podemos dizer que Chico Xavier também era muito feio, por dentro.

BRASIL TEM TRADIÇÃO DE ÍDOLOS POPULARES CONSERVADORES

Lendo os livros e conhecendo os depoimentos de Chico Xavier, não apenas as ideias que soam agradáveis - ainda mais quando a maioria dos chiquistas nunca sofreu na vida e, por isso, em contradição, acham que o sofrimento, para o outro, é "uma maravilha" - , mas também as mais sombrias, como o reacionarismo convicto do "médium", se conhece uma realidade que muitos ainda teimam, até com preocupante insistência, em rejeitar.

Afinal, temos ídolos tão populares quanto Chico Xavier que são notáveis pelo conservadorismo extremo. Pelé, Sílvio Santos, Roberto Carlos, Hebe Camargo e mesmo Regina Duarte - que iniciou carreira nos anos 1960 como a "namoradinha do Brasil" e interpretou personagens marcadas pelo empoderamento feminino - são exemplos explícitos disso.

Monteiro Lobato, autor de Sítio do Picapau Amarelo, era simpatizante da Eugenia - doutrina racista que buscava o controle populacional para permitir que uma "raça superior" se multiplicasse em detrimento de outras "inferiores" - e da Klu Klux Klan, grupo nazista estadunidense.

O pano de fundo ultraconservador de Chico Xavier sempre foi mais explícito e realista do que muita gente que virou reacionária de carteirinha. Se não nos chocamos quando nomes como o roqueiro Roger Rocha Moreira e a ex-jogadora de vôlei Ana Paula Henkel, a "Ana Paula do Vôlei", são extremamente reacionários, para que saltar da cadeira com revolta desnecessária quando se fala que o "bondoso médium" era um reacionário de carteirinha.

A família de Chico Xavier era conservadora. Sua formação laica e religiosa, conservadoras. Suas ideias remetem claramente o propósito da submissão humana. Ele defendia que os sofrimentos, por piores que fossem, devam ser aceitos em silêncio. Ele fez comentários raivosos contra organizações de esquerda no Brasil. Ele pedia, no auge da ditadura militar, para que oremos em favor dos militares (o perverso coronel Brilhante Ustra estava "dentro do pacote").

Se o condecorado pela Escola Superior de Guerra fosse, por exemplo, um apresentador de televisão, como Sílvio Santos, não haveria estranheza nem esforços relativistas de criar narrativas ridículas do tipo "Sílvio Santos aceitou a homenagem dos militares por causa da capacidade do apresentador de sorrir para todo mundo". Sílvio seria visto pela opinião pública como um "traidor" e até "hipócrita".

Chico Xavier até foi criticado pelas homenagens e o pessoal da época o via como um "médium de direita" dos mais deploráveis. Mas o malabarismo fácil da memória curta, num Brasil desinformado e emocionalmente vulnerável, se esquece disso e setores das esquerdas, em ato completamente falho, ainda tentam "reconstruir" um Chico Xavier fora da realidade, um "esquerdista" inconcebível pela luz da lógica, apenas por simbologias superficiais e meramente emotivas.

APOIADORES DE JAIR BOLSONARO

Jair Bolsonaro tornou-se eleito com a ajuda do apoio de personalidades consideradas popularescas, associadas a paradigmas de um "popular demais" tosco, definido como "brega" e "cafona", que envolve ídolos midiáticos decadentes, como comediantes e músicos em crise de popularidade, além de apresentadores da mídia sensacionalista e esportistas com visão meritocrática que soava como "música" até para as esquerdas, iludidas com a mística da "superação pessoal".

Ficamos estarrecidos ao ver que a base de apoio de Jair Bolsonaro incluiu atores, humoristas e músicos que não imaginávamos que iriam apoiá-lo. Membros importantes da campanha pelo Penta em 2002 (justamente a época em que morreu Chico Xavier), como Ronaldinho Gaúcho, Cafu, Rivaldo e o técnico Luiz Felipe Scolari, expressaram apoio a Bolsonaro.

Apesar disso, aceitamos esse apoio. Aceitamos também exemplos como roqueiros como Roger Rocha Moreira e Digão (Raimundos) apoiarem o bolsonarismo. Aceitamos que a sexy esportista Ana Paula Henkel se tornasse uma reacionária doentia. E ainda conseguimos dormir ao saber que até Djavan e Toquinho apoiaram Bolsonaro em 2018.

Mas quando se trata de Chico Xavier, as pessoas saltam da cadeira e pulam de raiva. "Como Chico Xavier apoiaria Jair Bolsonaro?", diriam "isentões" e "esquerdistas" com uma reação, por ironia, tipicamente bolsomínion.

Responde-se: com base nas ideias e valores que ele defendeu, voltados à obediência humana, à subserviência no trabalho, à conformação com o sofrimento extremo ou os sacrifícios acima dos limites para superá-lo (ou seja, para superar o sofrimento, tem-se mais sofrimento). É só verificar a obra de Chico Xavier e tomar cuidado para não cair da cadeira: trata-se de um receituário tipicamente ultraconservador, que deixaria os bolsonaristas de queixo caído.

Se vivesse em 2018, Chico Xavier apoiaria Jair Bolsonaro nos seguintes termos, que aqui simulamos com base no estilo de linguagem manifesto em livros e na entrevista do Pinga Fogo da TV Tupi:

"Longe de ser o candidato ideal para os brasileiros, considero que o irmão Jair se torna mais preparado para governar o Brasil, dentro de um projeto que promete o restabelecimento da moralidade e de medidas de acordo com os desígnios cristãos. Temo que o adversário, embora associado a visões consideradas em prol do progresso humano, esteja ligado a tradições comunistas que podem desvirtuar os brasileiros, seduzidos para a inquietação e o caos".

Chico Xavier estaria, depois, criticando o governo Bolsonaro, mas mesmo assim sem abrir mão do apoio ao presidente:

"Lamento que o irmão Jair Bolsonaro esteja envolvido em más companhias, que provocam as crises que maculam severamente o governo. Reprovo a escolha do sr. Abraham Weintraub para a Educação, antes tivesse escolhido uma figura como Magno Malta, que tem em si a Escola Sem Partido, um projeto pedagógico de acordo com os ensinamentos do Cristo, que, além de voltar a Educação apenas para o ato de ensinar a ler e escrever, evita corromper as salas de aula com a transformação do ensino em um perigoso fórum de debates, a desnortear as cabeças de nossas crianças e adolescentes, inserindo neles a revolta e a indignação, ao invés da misericórdia e do perdão.

Também pedimos apoio e respeito ao sr. Paulo Guedes, que está impedido de exercer o seu trabalho de combater a recessão, criando um projeto sadio de desenvolvimento econômico, no qual patrões e empregados possam livremente negociarem, como irmãos e não mais como adversários, como previam as antigas leis trabalhistas, já superadas pela nossa retomada moralizante de 2016".

Os chiquistas vão achar essa declaração "absurda", mas, convenhamos: é mais difícil um ídolo religioso ser progressista. As tradições religiosas no Brasil são inerentemente conservadoras, e se há progressistas altamente religiosos, eles devem parar para pensar se não são os próprios progressistas que são bastante conservadores.

Afinal, as pessoas costumam criticar o argueiro, o "cisco" que há nos olhos dos outros. Mas elas mesmas se esquecem de ver as traves de seus olhos, suas cegueiras emotivas ou mesmo cognitivas, que fazem muitos perderem tempo com raivas à toa e tentando argumentar o inargumentável. São justamente os chiquistas "isentos" e "de esquerda" os mais problemáticos em argumentação, piores do que muitos burros assumidos. Afinal, sua mania de argumentação os faz perderem o sono de tanto brigar com os fatos e a realidade.