Como os brasileiros sentem obsessão por Chico Xavier?


Falecido há 18 anos, Francisco Cândido Xavier é o maior espírito obsessor do Brasil. Isso porque sua idolatria segue níveis tão extremos que as pessoas se envergonham disso e acabam dissimulando seu fanatismo, dizendo que é apenas "admiração saudável", "adoração equilibrada" e outros argumentos similares.

Só que o nervosismo dos chiquistas, que, quando querem, são capazes de explodir no ódio que eles dizem serem incapazes de ter, diz muito. Esquecem que a imagem de Chico Xavier que é alvo de muita adoração foi uma propaganda enganosa montada com a habilidade do método Malcolm Muggeridge já feito para endeusar outra figura igualmente lamentável, Madre Teresa de Calcutá.

Pelo menos no exterior, onde o senso crítico não é discriminado, houve a coragem de um Christopher Hitchens para denunciar, através de entrevistas e pesquisas diversas, o lado negativo de Madre Teresa de Calcutá. De tão graves, as denúncias inspiraram o título sombrio de "anjo do inferno" dada à albanesa, devido ao fato dela ter deixado seus alojados em condições sub-humanas, expostos à contaminação, à desnutrição e, por isso, sucumbindo à morte prematura.

Aqui o "médium" que realizou fraudes literárias agindo em cumplicidade com os dirigentes da "Federação Espírita Brasileira", crime que foi revelado, em "fogo amigo", pela amiga do "médium", Suely Caldas Schubert, é poupado e quem deveria, ao menos, verificar sua trajetória criticamente, reage com medo, quando muito atuando em arremedos de investigações que nada trazem de novo, sendo apenas reportagens, monografias ou inquéritos feitos para inglês ver.

A "caridade indiscutível" de Chico Xavier é defendida sem que um mínimo fundamento fosse desenvolvido. Em favor de Chico Xavier, qualquer boato é aceito, confortavelmente. Contra Chico Xavier, se exige tanto rigor nos argumentos que nem mesmo argumentar vale, porque mesmo as provas contundentes não são aceitas e, com um terraplanismo de fazer inveja a Olavo de Carvalho, há quem desconfie do que é óbvio, evidente e comprovado.

SOFRA MAIS, E CONSEGUIRÁ UM LUGAR NO CÉU

Fala-se muito que as igrejas evangélicas "neopentecostais" comercializam a fé e vendem "terrenos do céu" para os fiéis, desde que eles paguem seus dízimos para os pastores de cada templo. Mas o que dizer das "ideias iluminadas" de Chico Xavier que, calcadas na Teologia do Sofrimento, pedem para a pessoa aceitar os piores sofrimentos, em silêncio e "sem queixumes" (conforme o "médium" dizia), com o objetivo de encurtar o "caminho para Deus"?

Antes que os chiquistas saltem da cadeira e perguntem "Quem falou que Chico Xavier defende a Teologia do Sofrimento?", achando que nunca viram tal referência, é bom lembrar que são as ideias que comprovam isso, de maneira explícita e contundente.

A ideia de se conformar com a desgraça ou, então, ter que se sacrificar acima dos limites para superá-la, e ainda assim sob o preço de passar pano nos opressores e algozes de toda espécie, seguem exatamente os princípios da Teologia do Sofrimento. Em outras palavras, a natureza do produto é o próprio produto, ainda que fosse vendido sem rótulo.

Pelo menos, os fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus não sofrem a dor física. Evidentemente, é cruel pessoas pobres pagarem em dinheiro o que poderia lhes servir para comprar mais alimentos, e não raro pessoas davam eletrodomésticos e até automóveis para "comprar um lugar no céu".

Mas e a dor física, as humilhações, os infortúnios, as perdas de entes mais queridos? No caso de Chico Xavier, o preço de "atingir o céu" é bem mais caro. Não são apenas danos materiais, são danos humanos ou morais. Não por acaso, seguidores idosos de Chico Xavier, estranhamente, viam alguns de seus filhos morrerem prematuramente, de repente, como que numa maldição.

As pessoas que mais idolatram Chico Xavier e argumentam a favor dele são pessoas remediadas e bem de vida, e, mesmo quando se autoproclamam "progressistas", são bastante conservadoras, para não dizer profundamente reacionárias. Afinal, as sombras da personalidade humana habitam o inconsciente até mesmo de muita gente que se diz de esquerda e usa todo o aparato de "esquerdismo convicto", com "apaixonadas" bajulações a Lula e Dilma Rousseff e a tudo que soar "socialista" para esconder o direitismo ameaçador de seus sentimentos ocultos.

PESSOAS BEM DE VIDA

É muito fácil defender um suposto símbolo de caridade que muitos atribuem a Chico Xavier, que, no entanto, exerceu uma "filantropia" espetacularizada e de resultados medíocres, de uma forma bem semelhante ao que hoje vemos na "caridade" do apresentador e empresário Luciano Huck.

Huck assumiu que admira Chico Xavier. A suposta caridade do apresentador do Caldeirão do Huck já teve como precedente a "caridade-show" de Chico Xavier, que, numa época de imprensa monolítica e parcial, sem algum contraponto midiático à altura, foi "santificado" a partir de uma narrativa única, feita pela mídia dominante, dentro de um padrão conservador de promover um suposto ativista para tentar evitar, ou ao menos, abafar a ascensão do líder sindical Luís Inácio Lula da Silva.

Daí que Chico Xavier era um anti-petista por antecipação, para desespero dos "espíritas de esquerda" que tentam mil malabarismos para promover o "médium" - cujo reacionarismo se equipara a 99% do bolsonarismo - para o público progressista.

E por que tanta adoração a Chico Xavier? Simples, é porque ele representa símbolos de virtudes humanas que ninguém quer exercer por conta própria. As virtudes humanas se tornam "privatizadas" em Chico Xavier, que nem tinha um quinto das virtudes que se falam tanto dele.

Num país em que só o ódio é "público", as virtudes se tornam uma "franquia" em Chico Xavier, tratado como se fosse "dono da verdade". Acusações graves contra Chico Xavier, que vão da deturpação do Espiritismo à defesa da ditadura militar, sempre são abafadas por argumentações de valor duvidoso, desmontáveis por um raciocínio mais lógico, mas mesmo assim aceitas como se a Verdade não pudesse agir contra Chico Xavier.

É assustador que haja um único homem que seja tratado como acima da Verdade, da Lógica e do Bom Senso. Isso é mistificação, e também esconde os sentimentos sombrios dos chiquistas, que são odiosos, temperamentais e altamente conservadores, por mais que se ocultem em simulacros de progressismo, como os tais "médiuns de esquerda".

Em boa parte, os chiquistas desprezam os velhos e os pobres, ou não os valorizam da forma devida. Montam seus donativos como se os pobres fossem lixo, pois lhes dão roupas fora de moda ou com algum sério problema (tecido rasgado, mofo ou manchas de difícil remoção), e jogam seus idosos para asilos qualquer nota que encontram na sua frente.

Mas, independente de sérias imperfeições, marcadas por um sentimento explícita ou sutilmente elitista, os chiquistas escondem seus defeitos mais sombrios com a "admiração equilibrada" (eufemismo para idolatria fanática) a Chico Xavier, apegadas ao mito de "fada-madrinha do mundo real" a que se reduziu o "médium" nos últimos 45 anos.

A "caridade padrão Luciano Huck" de Chico Xavier vira desculpa para tudo, sobretudo de gente que não tem coragem de desenvolver, por conta própria, suas próprias virtudes, dependendo sempre de uma simbologia da fé e de algum símbolo religioso, como o próprio "médium", para fabricar uma "bondade" feita para agradar os outros.

A obsessão por Chico Xavier representa uma simbologia de pretensa bondade, mais uma "bondade" ritualística do que um sentimento espontâneo, apesar de todos os discursos jurando haver tamanha "espontaneidade". Mas as palavras disfarçam, mentem e escondem, e não é a beleza das palavras que trará a sinceridade dos sentimentos.

Essa obsessão, que rende uma adoração irremediavelmente fanática, é marcada também pela ignorância e pela desinformação. A maioria dos brasileiros desconhece que o Espiritismo aqui é deturpado, que se vende gato por lebre e o que se tem sob o rótulo de "espiritismo kardecista" é somente uma repaginação do Catolicismo medieval, que prevaleceu no Brasil durante o período colonial.

Como os brasileiros estão acostumados com o Catolicismo medieval, entendido sob o eufemismo das "tradições religiosas", e como a desinformação e a confusão são constantes no Brasil, a idolatria de Chico Xavier encontra terreno nesse contexto, no qual as pessoas chegam a confundir ideias próprias da Teologia do Sofrimento, de níveis medievais, com misticismo reformador de origens hindu ou chinesas.

Os chiquistas possuem as traves nos olhos que os fazem ridicularizar e esnobar os argueiros nos olhos dos neopentecostais. A desinformação dominante, num país em que as pessoas são incapazes de entender a si mesmas, quando mais a diferir uma falsa psicografia sob o nome "Humberto de Campos" com a obra original do escritor maranhense, permite a idolatria a Chico Xavier, a ponto dele, apesar de sua deturpação criminosa, com indícios de charlatanismo, ser aproveitado em tentativas de recuperar as bases espíritas originais.

Neste caso, as bases kardecianas só são recuperadas da boca para fora, e ainda assim de maneira limitada, pois quando se chega ao igrejismo medieval de Chico Xavier, o cientificismo kardeciano se cala e finge que não é com o "médium". É preocupante que muitos passam pano em Chico Xavier até nos piores momentos de sua trajetória, achando que ele "aprendeu com o tempo".

Não, Chico Xavier não aprendeu com o tempo. Morreu tendo pavor de Lula e encerrou a vida defendendo o PSDB (apesar de não ir com a cara de José Serra e preferir Aécio Neves, que visitou o "médium" no final da vida e a admiração entre ambos era mútua).

Além disso, Chico Xavier continuou plagiando - em 1981, ele plagiou um texto já falsamente atribuído a Sócrates (?! - Sócrates não deixou escritos) originalmente publicado em 1914 - e, em 1993, acobertou os crimes de João Teixeira de Faria, o João de Deus, doando um terreno para sua Casa Dom Inácio de Loyola.

Chico Xavier apoiou fraudes de materialização nos anos 1950 e 1960, com atestados provando sua caligrafia pessoal. Nedyr Mendes da Rocha, fotógrafo de Otília Diogo, registrou a cumplicidade de um Chico Xavier animado e comunicativo, em certas fotos explicando detalhes sobre a farsa, como se estivesse querendo enganar os outros, da mesma forma que a parceira.

Sua obra "mediúnica", seja evocando grandes escritores, seja evocando pessoas comuns, sempre apresentou problemas em aspectos pessoais. Olavo Bilac era associado a "psicografias" nas quais inexistia seu estilo poético sofisticado. Jair Presente "escrevia do além" como se tivesse "cheirado umas", em texto estranhamente neurótico e forçadamente coloquial.

E Chico Xavier, que muitos acreditavam ser "o amor em pessoa", reagiu rispidamente à desconfiança dos amigos de Jair Presente, definindo tal atitude como "bobagem da grossa". Enquanto isso, havia também acusações de leitura fria e "colas" bibliográficas - que iam de diários pessoais do falecido enviados por parentes até matérias da imprensa - na produção das "cartas mediúnicas" que faziam pessoas fazerem longas filas para consultar com Chico Xavier.

O quanto grave foi o apoio de Chico Xavier à ditadura militar, classificando como "reino de amor" o projeto político das Forças Armadas, fundamentado na tortura, na censura, na repressão e nos assassinatos de opositores, seja pela via institucional de órgãos como o DOI-CODI, seja pela via informal de esquadrões da morte (precursores das atuais milícias) e de pistoleiros de aluguel pagos pelo latifúndio.

Além disso, o quanto agravante foi a condecoração da Escola Superior de Guerra a Chico Xavier, oferecendo suas instalações para o "médium" palestrar, recebendo dos opressores os prêmios da Terra, sem que o beneficiado contestasse o nome belicoso da instituição, oposto à missão pacifista do Cristo! E a Escola Superior de Guerra, em tempo de radicalismo ditatorial, nunca perderia tempo premiando quem não colaborasse com a ditadura militar, e, se premiou Chico Xavier, é porque ele foi um colaborador e tanto.

Tantas fraudes e irregularidades e o pessoal passando pano em Chico Xavier. E isso quando seus piores erros eram revelados, mesmo sem querer (como no caso de Suely Caldas Schubert), por "fogos amigos". Se gente simpática ao "médium" não consegue esconder suas falcatruas, é porque isso é muito grave. E se tem gente passando pano em tudo isso, é porque é mais grave ainda.

A adoração a Chico Xavier, na verdade, é um artifício para muitas pessoas esconderem sua hipocrisia ou sua ignorância, entre outros aspectos sombrios do inconsciente humano, escondidos por falsas posturas positivas feitas para agradar os outros e a eleger um farsante deturpador da causa espírita como "símbolo de bondade" que nem o próprio "médium" teve em vida. Ou seja, se alguém dá uma consideração, por menor que seja, a Chico Xavier, é porque há alguma coisa errada com esse adorador.