Ditadura militar teria patrocinado "neopentecostais" e "espíritas" para enfraquecer Catolicismo

OS VENDILHÕES DOS TEMPLOS E O ESCRIBA: EXPLORADORES DA FÉ DO POVO.
Alguém parou para pensar a respeito do aparecimento ou crescimento tanto de seitas "evangélicas neopentecostais" como a Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da Graça de Deus e a Assembleia de Deus, e do "movimento espírita", através da "Federação Espírita Brasileira"?
Comparando o tempo em que essas religiões, aparentemente de forma repentina, surgiram ou cresceram, com o contexto político da época, é de surpreender que foi justamente num tempo em que o Catolicismo reforçava o caráter opositor ao poder ditatorial que as outras religiões, acima citadas, ganharam uma popularidade que parece repentina e novidadeira.
Lembremos que, na época do AI-5, que tornou mais rígida a repressão ditatorial, foi justamente a Igreja Católica que atuava na oposição ao regime, denunciando injustiças e violências, atuando em projetos assistenciais diversos, desenvolvendo projetos como as Comunidades Eclesiais de Base, adotando o método pedagógico de Paulo Freire e oferecendo proteção a perseguidos da ditadura, abrigando-os em igrejas ou ajudando-os na busca do exílio.
Isso colocou a maioria da Igreja Católica numa situação de animosidade pelo poder ditatorial, que via nos católicos um foco de subversão esquerdista. Daí que há denúncias de que padres e missionários passaram a ser mortos não só pela repressão ditatorial, mas também pela ação informal da pistolagem, através de jagunços ou "justiceiros" que também matavam ativistas católicos.
Um dos casos famosos foi do padre pernambucano Antônio Henrique Pereira Neto, o padre Henrique, assessor de Dom Hélder Câmara, então arcebispo de Olinda e Recife. Só para perceber o nível da crueldade, padre Henrique, depois de preso, em 27 de maio de 1969, com apenas 29 anos, foi violentamente torturado, tendo recebido diversas facadas, morto a tiros e em seu pescoço se colocou uma corda, simulando enforcamento, para dizer que ele "se suicidou".
CONSERVADORISMO DE CHICO XAVIER
Ainda se depende de investigação, mas a suspeita é que, diante da imagem "subversiva" que o Catolicismo brasileiro passou a exercer ao atuar como opositor da ditadura militar, cinco anos após sua ala direitista ter reivindicado o golpe militar de 1964, através da Marcha da Família Unida com Deus pela Liberdade, a ditadura militar teria financiado outras religiões na tentativa de enfraquecer a Igreja Católica.
Evidentemente que, hoje, fala-se muito das seitas "neopentecostais", como a Igreja Universal e a Igreja Internacional da Graça de Deus, que se tornaram "ovos da serpente" de um direitismo social que esteve latente no final da ditadura militar e que voltou a eclodir em 2016.
No entanto, esquece-se que o "espiritismo" brasileiro, que chega ao cinismo hipócrita de bajular a figura de Dom Paulo Evaristo Arns e sua irmã Zilda Arns, duas figuras católicas e humanistas que repudiaram a opressão ditatorial, também cresceu num momento de endurecimento da ditadura militar e, depois, da crise que a própria ditadura causou pelos seus abusos e pela farsa econômica do "milagre brasileiro".
Com uma tese sem fundamento, a "santidade" de Francisco Cândido Xavier (o mito do "igual apreço" a opressores e oprimidos, em suposto ideal conciliador) foi usada para tentar relativizar o apoio mais do que convicto, com apetites que hoje seriam considerados bolsonaristas, ao golpe militar de 1964, à ditadura militar e ao AI-5, e a premiação que o "médium" recebeu, com direito a palestras, pela Escola Superior de Guerra, fato noticiado pelo jornal Última Hora, em 1972.
Até um analfabeto político consideraria que a Escola Superior de Guerra, no momento de radicalização do poder ditatorial, não iria perder tempo homenageando quem não colaborasse com a ditadura militar, porque oferecer instalações e fabricar prêmios custa dinheiro. A tese de que Chico Xavier aceitou as homenagens "por estratégia" e a ESG o premiou também por outra "estratégia" são desprovidas de embasamento e soam tão inverídicas quanto quaisquer fake news de hoje em dia.
Daí que a tese de que Chico Xavier colaborou com a ditadura militar pode ser entendida como um fato verídico, porque existem argumentos lógicos e provas consistentes do ultraconservadorismo do "médium", cuja obra doutrinária era fundamentada pela Teologia do Sofrimento. O próprio "médium" tinha raízes sociais profundamente conservadoras e era considerado um "caxias", termo coloquial atribuído a pessoas que vivem em total obediência aos valores e normais sociais dominantes.
O próprio aparato ecumênico de Chico Xavier interessava à ditadura militar desviar fiéis do Catolicismo "esquerdizado". Com isso, se matava dois coelhos num golpe só, pois, além de Chico Xavier virar um ídolo religioso "sem batina", e aparentemente "sem vínculos religiosos" - é estratégia dos "espíritas" cooptar adeptos de outras religiões e até ateus, supostamente sem que eles abram mão de suas crenças - , ele também virou um suposto ativista do conservadorismo ideológico social.
Chico Xavier foi pioneiro anti-petista, porque seu mito de suposto filantropo - com "realizações" no "atendimento" aos pobres comparável à filantropia de baixos efeitos promovida, hoje, por Luciano Huck - era promovido para desviar as atenções da opinião pública para um líder sindical que chamava a atenção do povo brasileiro, chamado Luís Inácio Lula da Silva, mais tarde fundador e um dos principais líderes, até hoje, do Partido dos Trabalhadores, pelo qual exerceu dois mandatos presidenciais.
PROPAGANDA REQUER MUITO DINHEIRO
Certamente não foi a varinha de uma fada-madrinha que fez crescerem as religiões "pentecostais" e "espírita" para "rechear" de diversidade o âmbito das religiões brasileiras. As religiões "evangélicas neopentecostais" e "espírita" devem ter recebido generosos investimentos estatais durante a ditadura militar, algo que merece investigação jornalística, mas é uma tese bastante plausível.
Afinal, o objetivo não era "diversificar a fé", mas neutralizar a Igreja Católica que, na maioria de seus integrantes e lideranças, atuava em oposição ao poder ditatorial e articulava projetos de conscientização social e política a operários e camponeses. O combate à supremacia católica era uma mera desculpa, a ideia é investir em outras religiões que pudessem oferecer melhor sustentáculo para o poder ditatorial.
O que sabemos é que o crescimento não surge do nada. Não se sabe sequer o quanto foi investido para auxiliar o crescimento tanto da Igreja Universal quanto da FEB e o favorecimento na promoção de personalidades como Edir Macedo e Chico Xavier.
A inicial rivalidade entre "neopentecostais" e "espíritas" foi apenas circunstancial, sobretudo envolvendo concorrência midiática, entre a Rede Globo de Televisão - que promoveu Chico Xavier como um "cristão sem batina" - e as emissoras concorrentes, que arrendavam horários para Edir Macedo e Romildo Ribeiro Soares, o R. R. Soares.
Fora essa aparente rivalidade, vemos também que Chico Xavier era cortejado também pela "imprensa marrom", a chamada imprensa popularesca que tem como elementos principais explorar fofocas de famosos e cobertura policial - a afinidade dessa imprensa com Chico Xavier está, sobretudo, na espetacularização da morte - , e isso fez com que houvesse até delegados e jornalistas policialescos afinados e entrosados com o "bondoso médium".
Para promover essa propaganda, é necessário dinheiro para difundir campanhas e persuadir o público. Não são os "olhos verdes" que muitos acreditam ter tido Jesus Cristo (apesar dele ter sido de etnia árabe) que permitiram o crescimento de "evangélicos" e "espíritas", mas possivelmente de verbas estatais que a ditadura financiou, a título de "ajudar entidades filantrópicas", como tais religiões se situavam institucionalmente.
O que sabemos é que esse crescimento se deu num contexto de que ditadura militar e Igreja Católica entravam em conflito e se multiplicavam eventos católicos que buscavam, pela Teologia da Libertação, a emancipação do povo pobre de forma a ameaçar os privilégios das elites do poder sócio-econômico.
Os "espíritas" vendem a imagem de "progressistas", dizem praticar a "mesma Assistência Social" da Teologia da Libertação, mas esse discurso é falso e mentiroso. O que o "espiritismo" defende é o Assistencialismo, caridade meramente paliativa que não combate as raízes das desigualdades sociais, apenas minimizando seus efeitos drásticos, até para evitar uma revolta popular. Sabendo da suposta caridade de Luciano Huck, podemos entender por que a de Chico Xavier era tão fajuta e ineficaz.
As narrativas enganosas escondem que o "espiritismo" brasileiro se volta mais a pedir para que os oprimidos aceitem suas desgraças, dentro de valores que incluem dogmas da meritocracia. E Chico Xavier era um dos conservadores mais radicais, e prestando atenção à sua obra doutrinária e filantrópica, iremos com certeza concluir que ele era um "médium de direita" dos mais radicais e, como "caridoso", nunca foi além dos níveis medíocres hoje representados por Luciano Huck.